Tome como exemplo as roteiristas deste longa, Karen Leigh Hopkins e Jessie Nelson. No passado, elas escreveram “Lado a Lado”, um filme do qual até gosto um bocado, mas neste novo trabalho em conjunto elas criam um “chick flick” (o famigerado “filme de mulherzinha”) protagonizado por personagens antiquadas (uma mãe arranjando casamento para a filha? Se o enredo não está no mínimo um século atrasado, deveria ao menos ser situado em um país que ainda preza essa tradição), vistas sob uma perspectiva, por incrível que pareça, machista. Afinal, as mulheres do filme ou estão a) preocupadas em arranjar um marido; ou b) cozinhando, já que foi esta a ocupação encontrada pelas roteiristas para as personagens de Diane Keaton (“Alguém Tem Que Ceder) e Mandy Moore (“Tudo Pela Fama”), que vivem mãe e filha. Para completar o quadro, temos Lauren Graham (da série “Gilmore Girls”) como uma psicóloga – o que seria um sinal de confiança das roteiristas, se elas não a transformassem numa profissional sem um pingo de ética que fala sobre seus pacientes com outras pessoas – e Piper Perabo (“Show Bar”), cuja única “virtude” levantada é a de ser a campeã de orgasmos consecutivos entre suas irmãs.
Uma “bela” família, não? Já não bastasse Diane Keaton (possivelmente no papel mais irritante de sua carreira) submeter o público a seus ataques de histeria e seu falatório incessante (compartilhado pela protagonista, a até certo ponto talentosa Mandy Moore), o filme parece fazer questão de desacatar qualquer vestígio de dignidade masculina, dos dois lados da tela. Ou este é um filme feito somente para adolescentes escandalosas que vão ao cinema em grupo e parecem mais preocupadas não com a tela gigante a sua frente, mas sim com as telinhas brilhantes de seus celulares (para mim, um incômodo ainda maior do que o som do aparelho tocando)?
O que vou escrever a seguir não é segredo, pois é tão previsível que, no momento em que você começar a assistir ao filme, já saberá como ele irá terminar. Na verdade, eu não me importo realmente se estou estragando alguma coisa, pois “Minha Mãe Quer Que Eu Case” possui seu próprio mecanismo de auto-destruição. É uma daquelas bombas que são um prato cheio para nós, críticos, expormos nosso talento para falar mal de um roteiro mal acabado e destilar nossa ironia em observações sobre a fragilidade dos personagens e suas inconsistências narrativas e morais.
O fato é que Karen Leigh Hopkins e Jessie Nelson fazem de Johnny, personagem de Gabriel Macht (“Uma Canção de Amor Para Bobby Long”), o joguete que representa tudo aquilo que elas enxergam no paradigma do “homem ideal”: um cara bonito, bacana, divertido, descolado, honesto, que enfrenta a vida com bom humor e a cabeça erguida, mesmo tendo diversos problemas, como ter que cuidar de um filho sozinho, ganhando apenas o que consegue com suas aulas de música e apresentações em restaurantes. Esperem! Esqueci de uma qualidade que é essencial para essas roteiristas: esse homem deve ser, acima de tudo, extremamente tolerante, já que ele não deve se importar se a sua garota estiver saindo com outro ao mesmo tempo e a mãe dela for uma megera irritante, interesseira, materialista e que desconta no mundo sua frustração por não saber mais o que é gozar.
Pobre Johnny… (Reparem que até mesmo o nome escolhido é bem genérico, ou seria melhor dizer “bem abrangente”?)
Não há problema de o filme acabar com o casalsinho junto e feliz. Não há problema mesmo. O que emputece é fazer o cara correr atrás da garota, como se ele é quem estivesse perdendo alguma grande coisa. Já vimos isso acontecer no final de “Dizem Por Aí”, outro “chick flick” que percorre o mesmo caminho: Mark Ruffalo é o bom partido, mas Jennifer Aniston não pensa duas vezes ao traí-lo com Kevin Costner, o quarentão rico de óculos escuros e carro esporte; não bastasse ele ter que perdoá-la, ainda o fazem descer correndo uns dez andares de escada só para alcançá-la na porta do elevador e dizer: “Eu não vivo sem você.” Isso é fazer muito pouco dos homens…
O que torna “Minha Mãe Quer Que Eu Case” pior do que “Dizem Por Aí” é que o “outro” com quem Mandy Moore sai (Tom Everett Scott, de “The Wonders – O Sonho Não Acabou”) não é um mulherengo como Kevin Costner, mas um sujeito que possui um bom caráter, apesar de ser um pouco egoísta. Em nenhum momento ele faz algo que justifique o esparro que a menina lhe dá quando descobre que a mãe estava armando seu casamento. Se alguém neste filme está errado é obviamente a protagonista, que decide, por livre e espontânea vontade, transar com os dois e aplicar o golpe do “Me desculpe, eu estava confusa!” Percebem a contradição? Como as roteiristas querem colocar uma personagem moderninha, da era do “ficar”, em um filme retrógado como este?
Eu sei, eu sei… Eu nem deveria perder meu tempo assistindo ou mesmo escrevendo sobre algo como “Minha Mãe Quer Que Eu Case”, que não é o primeiro e nem será o último a afrontar a inteligência do público (homens e mulheres) dessa forma. Mas se as roteiristas têm o direito de extravasar seus sentimentos mal resolvidos, eu também posso descontar minhas raivas falando mal do filme delas, correto? Ao menos, para ler esse texto, você não terá que pagar o preço do ingresso… E, modéstia a parte, ainda é possível que você tenha se divertido mais chegando até aqui.
Minha Mãe Quer Que Eu Case (Because I Said So, 2007, EUA), dir.: Michael Lehmann – em cartaz nos cinemas