Na verdade, o protagonista veio do livro de Steven Gould, e não de uma HQ, mas sua história de origem é típica de um super-herói. Em determinado ponto de sua vida, David Rice (Hayden Christensen) sofre uma grande pressão emocional e “ativa” seu superpoder: a habilidade de se teletransportar. Mas eis que ele escolhe não se tornar um combatente do crime: ao invés disso, decide roubar um banco e viver do dinheiro dos outros, sem dar a mínima para o mundo. David é como um membro renegado dos X-Men. Pense em Homem de Gelo e Pyro, como se o filme fosse sobre o segundo.
Certamente é um bom conceito que o diretor Doug Liman (“Vamos Nessa”, “Sr. e Sra. Smith”) tem nas mãos: contar a história de um personagem que deliberadamente escolhe se tornar um anti-herói e tentar fazer o público se simpatizar por ele. David não faz mal a ninguém, logo não é um vilão clássico que deseja matar as pessoas, conquistar poder, dominar o mundo etc. Ele é apenas egoísta o bastante para usar seu dom em benefício próprio. E o irônico é que quem é pintado como vilão é o personagem de Samuel L. Jackson, Roland, um agente federal que caça esses jumpers (sim, existem vários deles). Ele é o antagonista, mas pense e você verá que ele não tem nada de maligno. Na verdade, Roland é o mais próximo de herói que se tem aqui, afinal ele trabalha para capturar bandidos. Bandidos que se teleportam, mas bandidos.
O problema de “Jumper” é que tudo isso é uma premissa. E o filme falha justamente em desenvolvê-la. Somos apresentados a esses personagens e a toda uma mitologia, mas fica nisso. Não existe uma história que se encerra ao subir dos créditos. Se alguns filmes parecem não ter final, este parece ter só o início. E um início de 90 minutos, que deixa no ar a sensação de que haverá continuações. Para os desavisados que não sabem que se trata de uma série de livros, a frustração deve ser inevitável. O trio de roteiristas (entre eles David Goyer, de “Batman Begins” e “Blade”, e Simon Kinberg, de “X-Men – O Confronto Final”) deveria ter pensado nesse público e escrito uma história mais fechada.
O material é bom e, apesar de o elenco (à exceção de Jackson e Jamie Bell) não cooperar, ele é apresentado por Liman de maneira respeitável, com criatividade e boas cenas de ação. É um filme falho, sem dúvidas, longe de ser ótimo. Mas diverte e é original. Pena que não passe de um primeiro capítulo.
direção: Doug Liman; com: Hayden Christensen, Samuel L. Jackson, Diane Lane, Jamie Bell, Rachel Bilson, Michael Rooker, AnnaSophia Robb; roteiro: David S. Goyer, Jim Uhls, Simon Kinberg (baseado no livro de Steven Gould); produção: Lucas Foster, Simon Kinberg, Stacy Maes, Jay Sanders; fotografia: Barry Peterson; montagem: Saar Klein, Don Zimmerman; música: John Powell; estúdio: 20th Century Fox, New Regency Pictures; distribuição: 20th Century Fox. 90 min
Editor-chefe e criador do Cinematório. Jornalista profissional, mestre em Cinema pela Escola de Belas Artes da UFMG e crítico filiado à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e à Fipresci (Federação Internacional de Críticos de Cinema). Também integra a equipe de Jornalismo da Rádio Inconfidência, onde apresenta semanalmente o programa Cinefonia. Votante internacional do Globo de Ouro.