“Film Noir” tinha tudo para se tornar um filme cult. É uma animação feita exclusivamente para adultos, finalizada em um curto espaço de tempo, com baixíssimo orçamento e equipamentos limitados, além de, como o próprio título deixa claro, ser uma homenagem ao noir – um estilo de tamanha força e influência que deixou de ser gênero e virou uma forma de cinema.
Porém, por mais que os diretores D. Jud Jones e Risto Topaloski se esforcem em recriar a atmosfera típica, combinada com elementos mais modernos, eles não conseguem ser tão bem sucedidos quanto cineastas de outros títulos recentes que tiveram o mesmo intento, como “Sin City – A Cidade do Pecado” ou “Renaissance”.
O problema de “Film Noir” não é a precariedade da animação. “Deu a Louca na Chapeuzinho” é um exemplo de animação de garagem que supera muito bem sua técnica modesta contando uma história divertida e bem elaborada. Já aqui, o roteiro, além de fraco, faz clichês se passarem por referências ao estilo narrativo das tramas policiais que abundaram nos anos 40 e 50. E se você não se envolve, como não reparar nos outros problemas que cercam a produção?
Por exemplo: como não se sentir incomodado pelo desenho simplório dos personagens, que dá a impressão de estarmos vendo bonecos de rótulo de instruções de extintor de incêndio transando ou participando de tiroteios? E não é apenas porque são feios: a animação não permite que eles tenham mais do que duas expressões faciais – sério e zangado. Isso fica evidente em uma criança, que parece estar com medo, e em uma senhora, que parece estar angustiada. Sem os diálogos, fica difícil saber o que elas estão sentindo (como se já não bastasse a dublagem não lhes conferir personalidade).
A pobreza da animação também fica óbvia na movimentação dos personagens. É como se eles estivessem com sono, de tão lentamente que andam pelo cenário ou simplesmente se levantam de um sofá. E as cenas de ação mais parecem animatics – aquelas seqüências de pré-visualização utilizadas em muitos blockbusters para o diretor prever como a cena final ficará.
Parece que Jones e Topaloski queriam tanto, mas tanto fazer uma animação para adultos, com muita violência e cenas de sexo (estas, aliás, surgem tão gratuitamente que fazem o filme parecer um hentai), que se contentaram com o pouco que conseguiram alcançar com os recursos que tinham em mãos. Mais impressionante ainda é que um estúdio tenha comprado o filme e o lançado assim nos cinemas. Mais um ano de pós-produção teria feito muito bem ao produto final, pelo menos para que o visual não ficasse tão mal acabado. Do jeito que ficou, o longa mais parece uma versão temporária, sem efeitos especiais adicionados.
Se a intenção era ser uma homenagem ao cinema noir, infelizmente os diretores fizeram surtir o efeito contrário. Porque por mais que existam filmes noir ruins, ninguém tem dúvidas de que são os bons que devem ser lembrados.
direção: D. Jud Jones e Risto Topaloski; com vozes de: Mark Keller, Bettina Devin, Kristina Negrete, Victoria O’Toole, Jeff Atik; roteiro: D. Jud Jones; produção: Miodrag Certic; fotografia: Radan Popovic; montagem: Namub Elephantine; música: Mark Keller; estúdio: EasyE Films; distribuição: Downtown Filmes. 97 min
Editor-chefe e criador do Cinematório. Jornalista profissional, mestre em Cinema pela Escola de Belas Artes da UFMG e crítico filiado à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e à Fipresci (Federação Internacional de Críticos de Cinema). Também integra a equipe de Jornalismo da Rádio Inconfidência, onde apresenta semanalmente o programa Cinefonia. Votante internacional do Globo de Ouro.