George Clooney é o que parece estar forçando mais para ser engraçado. Ele até consegue ser em alguns momentos, mas os tiques que ele usa para compor o personagem soam mais como distração. Brad Pitt é o que mais busca o riso da platéia através do humor físico, gesticula muito, repete frases e gírias e usa expressões faciais um tanto quanto borrachudas. Não é o mesmo Pitt que vimos em “Onze, Doze, Treze Homens e Não Sei Mais Quantos Segredos”. Pode parecer artificial, um humor meio boboca, mas acaba funcionando na maioria das vezes e distancia o personagem da imagem da celebridade Brad Pitt – o que já não acontece com Clooney.
Os Coen aparecem mais no roteiro desta vez. Fizeram uma sátira a filmes de espionagem, utilizando trilha sonora que remete ao gênero o tempo todo. É engraçado, porque parece que estamos vendo um filme do gênero (já começa com um “plano de satélite” que vai mergulhando na Terra até chegar aos sapatos do personagem de Malkovich), mas as pessoas que habitam a tela jamais parecem se sentirem dentro de um filme de espionagem – ainda que, mais tarde, a paranóia tome conta de algumas delas.
Por mais que os Coen flertem com o pastelão em alguns momentos, eles o fazem com elegância e usam um humor fino. Agrada também a forma como eles são econômicos: não precisam mostrar um corpo sendo jogado num lago ou alguém sendo baleado, já que essas imagens desviariam o espectador do clima do filme. Mas quando isso surge nos diálogos dos agentes da CIA, fica engraçado. Se existe um problema, diz respeito aos personagens de Clooney, Swinton e Elizabeth Marvel (que interpreta a esposa de Clooney). Não há uma conclusão para eles.
Só há uma cena em que os Coen se exibem mais como diretores, no sentido de empregar um estilo na tela – e somente cineastas como eles conseguem causar uma surpresa tão grande, pegando o espectador quando ele menos espera. Não vou revelar qual é a cena, mas fica logo claro quando entra em ação a combinação de violência e humor negro, característica do cinema deles. E não há diálogos nesta seqüência – eu sempre acho que os Coen se saem muito melhor em cenas sem falas (embora nesta alguém esteja falando, os personagens não estão conversando um com o outro).
Em suma, “Queime Depois de Ler” é algo que se pode definir estranhamente como uma “comédia de espionagem sobre relacionamentos”, feita com inteligência e doses de sarcasmo, que diz o que tem a dizer e vai embora, sem enrolações. É o melhor dos Coen no gênero desde “E aí, Meu Irmão, Cadê Você?”.
direção: Ethan Coen, Joel Coen; com: George Clooney, Frances McDormand, John Malkovich, Tilda Swinton, Brad Pitt, Richard Jenkins, J.K. Simmons, Elizabeth Marvel; roteiro: Ethan Coen, Joel Coen; produção: Ethan Coen, Joel Coen, Tim Bevan, Eric Fellner; fotografia: Emmanuel Lubezki; montagem: Ethan Coen, Joel Coen (ambos como Roderick Jaynes); música: Carter Burwell; estúdio: Mike Zoss Productions, Relativity Media, Studio Canal, Working Title Films; distribuição: Paramount Pictures. 96 min