Deixa Ela Entrar

Com a febre “Crepúsculo” em seu auge, produções sobre vampiros podem ser vistas com uma certa desconfiança entre pessoas com mais de 20 anos. É compreensível, mas saiba que, se esta for a sua postura, você perderá obras interessantes protagonizadas pelos sugadores de sangue e uma delas é esta pérola sueca, “Deixa Ela Entrar”.

“Deixa Ela Entrar” tem elementos de terror. Possivelmente, quando for lançado em DVD, ficará na seção específica desse gênero nas locadoras. Mas o filme de Tomas Alfredson é muito mais do que isso. É, na verdade, na mistura de gêneros, que ele subverte todas as expectativas de um filme de horror, já que, além dos momentos apavorantes, a produção é um romance e um triste drama sobre o amadurecimento.



Uma das metades do romance é Oskar, um solitário garoto de 12 anos. No início do filme, presenciamos Oskar ensaiando facadas que, provavelmente, no futuro, serão destinadas a alguém. Mas logo descobrimos que se trata de um ensaio para um tipo de vingança contra alguns colegas de escola que não perdem a chance de maltratar o garoto. Vingança que, possivelmente, nunca iria acontecer, já que Oskar é frágil e passivo demais para responder à altura. Um menino isolado na escola e que não parece ter muita conexão com os pais. Ele conhece e logo se afeiçoa a uma menina também solitária, mas por outros motivos. Ela só sai à noite, anda descalça na neve e, como a própria diz, não é exatamente uma menina e tem mais ou menos 12 anos. Você já sabe do que se trata a nossa amiga, certo?

O interessante de “Deixa Ela Entrar” é que Alfredson usa o terror para mostrar o surgimento de um romance e o desenvolvimento de um drama. Entre cenas causadoras de aflição, somos testemunhas do nascimento e crescimento da cumplicidade entre os protagonistas, muito por, através de motivos diferentes, se parecerem. Ele é o “loser” da escola, e ela o completa, dá coragem ao garoto para revidar as provocações. E Eli recebe de Oskar a amizade, o desejo, que é tão difícil para ela, por ser uma vampira.

Apesar de contar com vários personagens, Alfredson e o roteirista John Ajvide Lindqvist (também autor do livro que deu origem ao filme) acertadamente se importam apenas com Eli e Oskar. Há um senhor que faz uma certa parceria com Eli, mas nós nunca sabemos o que ele é na verdade. Nem mesmo qual é o papel do pai de Oskar na vida do garoto. Se para algumas pessoas isto pode parecer estranho, afinal aparecem personagens que, no fim das contas, não tem uma razão e não são desenvolvidos, isso evita que “Deixa Ela Entrar” seja um filme simplório, de respostas fáceis ou didático.

Se você está cansado de vampiros, portanto, recomendo que faça um esforço e assista a este belo filme (no sentido estético também). Porque em “Deixa Ela Entrar”, ser vampiro, ou não, não é o que realmente importa. É apenas um pretexto para falar, de uma forma profunda, sobre o amadurecimento.

nota: 9/10 — veja no cinema e compre o DVD

Deixa Ela Entrar (Låt den rätte komma in ou Let the Right One In, 2008, Suécia)
direção: Tomas Alfredson; roteiro: John Ajvide Lindqvist (baseado em seu próprio livro); fotografia: Hoyte Van Hoytema; montagem: Tomas Alfredson, Dino Jonsäter; música: Johan Söderqvist; produção: Carl Molinder, John Nordling; com: Kåre Hedebrant, Lina Leandersson, Per Ragnar, Henrik Dahl, Karin Bergquist, Peter Carlberg, Ika Nord, Mikael Rahm; estúdio: EFTI; distribuição: Filmes da Mostra. 115 min