Apesar de ser o terceiro filme dessa leva de Zemeckis a ser feito também para projeção digital 3-D, “Scrooge”, baseado no clássico de Charles Dickens “Um Conto de Natal”, é o primeiro a que assisto neste formato. Sem comparar a “O Expresso Polar” e “A Lenda de Beowulf” neste quesito, mas comparando a tudo que já vi em 3-D até agora, “Scrooge” tem o trabalho mais imersivo e bonito. Os modelos são extremamente bem trabalhados e detalhados, e embora o aspecto “borrachudo” ainda esteja à vista, nota-se que as imperfeições dos filmes anteriores vêm sendo gradualmente melhoradas, como a falta de umidade dos olhos, a movimentação dura dos lábios e, principalmente, a reprodução dos trejeitos dos atores (os tiques gestuais de Jim Carrey são facilmente identificados, o que não acontece com Tom Hanks, por exemplo, em “O Expresso Polar”).
É uma pena, porém, que Zemeckis tenha optado por usar um tom tão escuro na direção de arte. Tudo bem que o protagonista é um homem amargo e que a óbvia opção do cineasta tenha sido usar a ótica do personagem para a visão de mundo do filme. Mas duvido que a maior parte do público infantil vá se sentir à vontade diante da tela. Mais que isso, acaba que a própria narrativa se torna pesada até mesmo para os adultos, muito melancólica, até chegar ao ato final quando vem a redenção e tudo clareia. “Up – Altas Aventuras” também traz um protagonista idoso e amargo (virou moda, já que também tivemos “Gran Torino” este ano), mas nem por isso o filme adota uma identidade visual tão sombria como a de “Scrooge”.
Também nota-se que há um “peso” excessivo na própria animação da câmera, e isto Zemeckis ainda não conseguiu corrigir desde “O Expresso Polar”. Basta compararmos a sequência de “Forrest Gump” em que a câmera segue uma pena flutuando às sequências semelhantes vistas nas animações de Zemeckis. A movimentação da câmera é diferente nelas, como se o “equipamento” usado pesasse uma tonelada e fosse puxado por um helicóptero. O que não impede que esses planos-sequências sejam bem feitos – a sensação que passam é que é estranha.
“Os Fantasmas de Scrooge” ainda representa outra grande evolução na “carreira motion-capture” de Zemeckis: finalmente, o cineasta se permite brincar novamente com o espaço cênico (sempre muito bem aproveitado e equilibrado no scope), criando cenas em que o absurdo predomina e justifica o filme ser uma animação. Por mais que “O Expresso Polar” e “A Lenda de Beowulf” sejam histórias também fantasiosas, há nesses filmes uma tentativa muito clara de Zemeckis de emular o real. Já aqui, embora insista em reproduzir fielmente os traços dos atores, ele já se permite usar mais caricaturas (no próprio Jim Carrey) e, a partir de certo ponto, pula de cabeça na vertigem da imaginação – o que, aposto, deve ter sido um tremendo alívio.
direção: Robert Zemeckis; roteiro: Robert Zemeckis (baseado no livro de Charles Dickens); fotografia: Robert Presley; montagem: Jeremiah O’Driscoll; música: Alan Silvestri; produção: Jack Rapke, Steve Starkey, Robert Zemeckis; com: Jim Carrey, Steve Valentine, Daryl Sabara, Sage Ryan, Ryan Ochoa, Gary Oldman, Colin Firth, Cary Elwes, Robin Wright Penn, Bob Hoskins; estúdio: ImageMovers, Walt Disney Pictures; distribuição: Walt Disney Pictures. 96 min