Sherlock Holmes

Quem é mais esperto: Sherlock Holmes ou Guy Ritchie? De certo, o cineasta não considera que a inteligência está na platéia. Nesta nova adaptação para o cinema do famoso detetive criado pelo escritor britânico Arthur Conan Doyle, Ritchie usa todo seu já conhecido arsenal de truques narrativos. E são tantas as vezes em que ele pára de contar história para explicar algo que acabou de acontecer – ou que aconteceu lá no início, ou que ainda irá acontecer – que é bem capaz de você ficar perdido ao invés de entender tudo o que se passa na tela.

É aquela velha história de pegar uma trama que nem é tão complicada assim e misturar os eventos para fazê-la parecer complexa. E há o risco de que surja até uma certa antipatia pelo protagonista, já que Ritchie não permite que o espectador participe do processo de investigação junto com o personagem. Ao invés de nos fazer caminhar ao lado de Holmes, Ritchie coloca o detetive sempre um passo à frente. Não sobra, para quem está na poltrona, a sensação recompensatória de ter “ajudado” a desvendar a trama. Ritchie quer que o espectador seja passivo.



Apesar da “bagunça organizada” que Ritchie promove, “Sherlock Holmes” felizmente se sustenta nas bases de sua origem policial. As características que o tornaram um dos mais célebres personagens do gênero estão presentes, portanto os fãs não precisam temer aquela terrível mania que alguns produtores e diretores têm de reinventar ou reimaginar personagens clássicos, quando na verdade o necessário é apenas achar uma boa história para ser contada.

A reinvenção ou reimaginação aqui fica apenas para o estilo visual, já que o estúdio entende que as platéias querem cenas de ação com extreme-slow motion, grandes efeitos especiais criados por computador, atores bonitos (sabia-se que Holmes era pugilista, mas não que era sarado) e toda sorte de artifício que dê ao filme uma cara “muderna”. Ritchie, portanto, é a pessoa certa para o trabalho, empregando o estilo de direção conhecido de filmes como “Snatch – Porcos e Diamantes” e “Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes”.

É o século 19 com cara de século 21. É mais ou menos o que aconteceu com “Jornada nas Estrelas”. Quem nunca imaginou ver o Capitão Kirk e o Sr. Spock em sequências de ação grandiosas e frenéticas certamente também nunca pensou um dia ouvir alguém dizer que Sherlock Holmes e o Dr. Watson estariam envolvidos em situações “de tirar o fôlego”. A grande diferença é que J.J. Abrams sabe filmar com mais elegância, sabe tratar a câmera com mais cuidado. Ritchie parece mais preocupado em se mostrar, e não em mostrar o filme.

Mas da mesma forma como acontece em “Star Trek”, a essência de Holmes é respeitada: a arrogância irresistível, a percepção aguda, a astúcia na dedução lógica dos enigmas. A nova cara de Holmes pode ser a de Robert Downey Jr. – cuja persona se encaixa bem em tipos irônicos como este e o Tony Stark de “Homem de Ferro” – mas o bom e velho detetive está lá, com seu humor peculiar, suas múltiplas habilidades e, claro, o cachimbo na boca.

nota: 6/10 — vale o ingresso

Sherlock Holmes (2009, EUA)
direção: Guy Ritchie; roteiro: Michael Robert Johnson, Anthony Peckham, Simon Kinberg; fotografia: Philippe Rousselot; montagem: James Herbert; música: Hans Zimmer; produção: Susan Downey, Dan Lin, Joel Silver, Lionel Wigram; com: Robert Downey Jr., Jude Law, Rachel McAdams, Mark Strong, Eddie Marsan, Robert Maillet, Geraldine James, Kelly Reilly; estúdio: Blackbird, Lin Pictures, Silver Pictures, Village Roadshow Pictures, Wigram Productions; distribuição: Warner Bros. 128 min