Ao bem da verdade, o Predador, “criatura criada” pela dupla Jim e John Thomas, não rende porque ele é apenas um desenho legal. É bom para ter o boneco na estante, mas não funciona mais nem mesmo como vilão. Nos filmes anteriores, você já era levado a torcer por ele contra os Aliens, ou seja, virou um herói e quase acontece o mesmo nesta mais recente empreitada. E prova da falta de ameaça do personagem é que os roteiristas de “Predadores” precisaram inventar animais (já batizados carinhosamente por aí como “predadogs“) para aumentar a sensação do perigo que os humanos na tela vivem.
Os homens e a única mulher do filme (Alice Braga) descobrem estar perdidos em um planeta que o espectador pode até pensar ser Pandora quando o primeiro predadog começa a correr atrás do grupo. Curioso é que, a não ser por o título do filme surgir na tela logo de cara, os primeiros dez minutos não dão nenhuma amostra de pertencerem a um longa da franquia, o que é até interessante. A introdução se baseia no mistério por trás do encontro daqueles personagens, cada um pertencente a uma etnia e um grupo criminoso diferente: há o guarda-costas de um cartel de drogas mexicano, um guerrilheiro de Serra Leoa, um mercenário americano, uma agente secreta do exército israelense, um soldado das forças especiais russas, um psicopata com roupa de presidiário, um membro da Yakuza. E Topher Grace.
Nesse começo, dá até uma sensação de que aproveitaram a premissa de “Lost”, só que no lugar de ursos polares e monstros de fumaça colocaram os Predadores. É meio que uma reinvenção da franquia, tanto é que se fossem outras criaturas ao invés dos Predadores, veríamos o mesmíssimo filme. A fraqueza da mitologia da série é evidenciada aí, já que as únicas características que fazem você se “sentir” dentro do universo do personagem são justamente as particularidades dele: a máscara, o visor térmico, a camuflagem invisível, os tiros de energia e as lâminas nos braços. E justamente por não haver novidade alguma nisso, um monstro original poderia beneficiar o filme.
Mas há a maldição do merchandising e a pegadinha do título: “Predadores”. Há princípio, você pode pensar, e até se empolgar por isso, que o plural é uma referência a “Aliens” (1986), o segundo filme da franquia “adversária” que consegue ser tão bom quanto o original (1979) de Ridley Scott, embora o tom empregado por James Cameron seja outro (o primeiro cai mais para o terror, o segundo é ação). Mas quando o personagem de Adrien Brody abre a boca para falar, fazendo voz rouca de herói sofrido, descobrimos que os roteiristas só tentaram dar uma de espertinhos para desdenhar da própria raça.
Nem tudo fede e há pelo menos dois momentos que valem o filme: um que é praticamente um spoiler se eu disser algo além de “Coronel Kurtz encontra Gollum” e outro que é uma tomada em plongée (isto é, filmada do alto, como se observássemos os atores “do céu”) mostrando uma luta num campo, enquanto o vento sopra a grama. É quando vemos que Antal possui consciência estética, mas não tem muito para onde ir com o material que lhe foi entregue.
Predadores (Predators, 2010, EUA)
direção: Nimród Antal; roteiro: Alex Litvak, Michael Finch; fotografia: Gyula Pados; montagem: Dan Zimmerman; música: John Debney; produção: Elizabeth Avellan, John Davis, Robert Rodriguez; com: Adrien Brody, Topher Grace, Alice Braga, Walton Goggins, Oleg Taktarov, Danny Trejo, Laurence Fishburne, Louis Ozawa Changchien, Mahershalalhashbaz Ali, Carey Jones, Brian Steele, Derek Mears; estúdio: 20th Century Fox, Troublemaker Studios, Davis Entertainment; distribuição: 20th Century Fox. 104 min
Editor-chefe e criador do Cinematório. Jornalista profissional, mestre em Cinema pela Escola de Belas Artes da UFMG e crítico filiado à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e à Fipresci (Federação Internacional de Críticos de Cinema). Também integra a equipe de Jornalismo da Rádio Inconfidência, onde apresenta semanalmente o programa Cinefonia. Votante internacional do Globo de Ouro.