Os aspectos que tornam a obra e o estilo de Lope singulares são apenas citados no filme, e de uma forma ainda mais superficial que uma página da Wikipedia é capaz de fazer. Bem diferente do que, por exemplo, Todd Haynes fez com Bob Dylan no inigualável “Não Estou Lá”, em “Lope”, a obra do artista jamais infuencia a forma ou o entendimento da narrativa para o espectador. Pelo contrário, Lope, que também serviu à Marinha espanhola, acaba passando por um espadachim insolente, um herói de uma história de Alexandre Dumas, que vive suas aventuras amorosas e, nas horas vagas, revoluciona o teatro espanhol.
Pode-se atribuir essa caracterização equivocada do personagem ao roteiro de Jordi Gasull e Ignacio del Moral, mas a culpa por “Lope” ter se tornado só mais um filme de época é toda de Waddington. O cineasta brasileiro não demonstra a mínima criatividade na construção dos planos e não consegue fugir do esquema de cores e iluminação que é usado em nove de cada dez longas do gênero. Aliás, é fácil imaginar que, se fosse feito no Brasil, o projeto daria uma perfeita minissérie da Globo. Feito no Reino Unido, fatalmente seria indicado ao Oscar.
Salvam-se no filme as boas atuações de Alberto Ammann, no papel principal, e de Leonor Watling, como Isabel, uma das amantes de Lope. As participações dos brasileiros Sônia Braga e Selton Mello são boas, mas não faria muita diferença se atores desconhecidos do público tivessem sido escalados.
No mais, Waddington merecia melhor sorte depois de dois bons filmes feitos no Brasil, “Eu Tu Eles” e “Casa de Areia”. Quem sabe um retorno ao país, depois desse auto-exílio no cinema internacional, traga de volta o cineasta que vinha traçando uma carreira sólida?
Lope (2010, Espanha/Brasil)
direção: Andrucha Waddington; roteiro: Jordi Gasull, Ignacio del Moral; fotografia: Ricardo Della Rosa; montagem: Sérgio Mekler; música: Fernando Velázquez; produção: Mercedes Gamero, Jordi Gasull, Edmon Roch, Teddy Villalba, Andrucha Waddington; com: Alberto Ammann, Leonor Watling, Pilar López de Ayala, Miguel Ángel Muñoz, Juan Diego, Luis Tosar, Selton Mello, Sonia Braga; estúdio: Antena 3 Films, Conspiração Filmes, Ikiru Films, El Toro Pictures; distribuição: Warner Bros. 106 min
Editor-chefe e criador do Cinematório. Jornalista profissional, mestre em Cinema pela Escola de Belas Artes da UFMG e crítico filiado à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e à Fipresci (Federação Internacional de Críticos de Cinema). Também integra a equipe de Jornalismo da Rádio Inconfidência, onde apresenta semanalmente o programa Cinefonia. Votante internacional do Globo de Ouro.