Fúria Sobre Rodas

Neste mundo pós-Tarantino em que nós, cinéfilos, vivemos, filmes B se tornaram atrações principais. Hoje, é cool fazer e participar de produções pretensamente despretensiosas, assim mesmo, nesse paradoxo. “Fúria Sobre Rodas” é isso: um filme de horror e ação estilo grindhouse, com machismos, grosserias e violência. Só que filmado em 3D. Se estivéssemos na época dos cinemas drive-in dos EUA, eu diria que é um filme para você abrir uma cerveja, colocar os óculos e curtir a viagem.

Assim como “Machete” e “Planeta Terror”, ambos de Robert Rodriguez, o filme de Patrick Lussier tem pelo menos um grande nome no elenco: Nicolas Cage. Cage, que pode ser considerado um ator faz-tudo, que participa desde os blockbusters da Disney, como “Aprendiz de Feiticeiro” e “A Lenda do Tesouro Perdido”, até filmes menores que ele ajuda a produzir através de sua companhia, a Saturn Films. Entre esses menores, estão grandes trabalhos, como “Vício Frenético”, de Werner Herzog, e “O Senhor das Armas”, de Andrew Niccol, mas também verdadeiras bombas, como “O Sacrifício”, pífia refilmagem do clássico do terror “O Homem de Palha”.



Nesse cenário da carreira de Cage, “Fúria Sobre Rodas” é um meio-termo. O ator está num de seus momentos de inspiração cômica, compondo um personagem que é uma mistura do Stuntman Mike, de “À Prova de Morte”, com o Motoqueiro Fantasma e o Exterminador do Futuro. Junto dele, no elenco, a gostosa briguenta da vez é Amber Heard (“Segurando as Pontas”). E o vilão é Billy Burke, o pai de Kristen Stewart em “Crepúsculo”. Todos eles, mais um dos melhores coadjuvantes do mundo, William Fichtner, se envolvem em uma trama de satanismo, com direito a tiroteios, porradas e perseguições de carros.

Já deu para sentir o drama. “Fúria Sobre Rodas” tem tudo que um filme do filão grindhouse pede. Está longe de ser ruim como a premissa faz parecer, mas, diferente dos filmes de Rodriguez e Tarantino, não possui aquele refinamento pessoal que esses diretores deram à renovação do subgênero. A impressão que dá é que Lussier corre no limite dos 120 KM por hora numa estrada em que cineastas como o próprio Tarantino, além de Rob Zombie, John Carpenter ou Dario Argento não hesitariam em ultrapassar os 200, 220, 250 KM. Lussier tem boas ideias, é sacana na criação das cenas e dos diálogos, mas parece não se sentir totalmente livre na ousadia que os filmes B permitem e pedem. Ou vai ver as limitações dele estão mesmo no talento e na criatividade (e em alguma cláusula anti-nudez no contrato de Amber Heard, que em “Informers – Geração Perdida” está muito mais desinibida).

Lussier começou a carreira como montador de Wes Craven, trabalhando na trilogia “Pânico” e em diversos outros filmes do criador de Freddy Krueger, e hoje possui sete títulos no currículo sob sua direção. O último, antes de “Fúria Sobre Rodas”, foi a refilmagem de “Dia dos Namorados Macabro”, também um filme tridimensional. Portanto, podemos dizer que, junto com James Cameron, ele é o cineasta mais experiente com o uso de 3D atualmente. Mais maduro do que no longa anterior, Lussier consegue trabalhar muito bem as perspectivas de campo, fazendo uso satisfatório da tecnologia, mesmo que recorra vez ou outra aos truques baratos de apontar ou atirar objetos na direção do espectador. Mas se é um filme B, ele tem esse direito, certo?

Fúria Sobre Rodas (Drive Angry, 2011, EUA)
direção: Patrick Lussier; roteiro: Patrick Lussier, Todd Farmer; fotografia: Brian Pearson; montagem: Devin C. Lussier, Patrick Lussier; produção: René Besson, Michael De Luca; com: Nicolas Cage, Amber Heard, William Fichtner, Billy Burke, David Morse, Todd Farmer, Christa Campbell, Charlotte Ross, Tom Atkins, Jack McGee; estúdio: Millennium Films, Nu Image Films, Saturn Films; distribuição: Warner Bros. 104 min