Trailers da semana: quando o cinema encontra a publicidade

Como publicitário, sou fascinado por trailers. E, por isso, resolvi comentar semanalmente as prévias lançadas. Não espere, entretanto, comentários sobre alguma produção baseados nestes filmetes de dois minutos. Comentarei sobre os trailers, tendo em vista o que eles são: uma poderosa peça publicária de uma campanha de marketing cinematográfico. Afinal, cinema precisa de espectadores e, seja para seduzir um público amplo ou um nicho específico, o trailer cumpre um papel essencial no mercado do audiovisual
STRAW DOGS, dirigido por Rod Lurie

Quando um trailer entrega o final do filme em sua primeira sequência, é sinal de que temos uma conclusão poderosa. O fato é que “Straw Dogs” é a refilmagem “Sob o Domínio do Mal” “”Sob o Domínio do Medo”, um controverso clássico de Sam Peckinpah, controverso justamente por sua catarse final. É um longa conhecido e suas cenas derradeiras mais ainda. O trailer do remake, dessa forma, não trabalha a conclusão como uma surpresa e, sim, como o grande atrativo, o motivo para ser assistido. A pergunta é: como ela se dará? Através de uma narrativa consistente que conduzirá de forma satisfatória ao epílogo? Ou o desfecho é a única coisa que segura? No caso do “Straw Dogs” de Peckinpah, a primeira situação é a mais apropriada. Qual será a de Rod Lurie, diretor da refilmagem? Lurie é competente o suficiente para não estragar um projeto, mas padrão demais para injetar algum tipo de personalidade.

A HORA DO ESPANTO, dirigido por Craig Gillespie

Não importa ter Colin Farrell, Toni Collete, Anton Yelchin e Christopher Mintz-Plasse no elenco. Muito menos ser dirigido por Craig Gillespie, realizador do bacaníssimo “Lars and The Real Girl”. É um filme de vampiro, e só isso basta. Sou só eu ou é uma interpretação possível para este trailer? Trata-se também de uma refilmagem, menos arriscada se comparada à “Straw Dogs”, entretanto. Afinal, “Hora do Espanto” é ótimo, mas é isso, apenas um filmaço muito divertido. Não existe uma assinatura de Sam Peckinpah que torna qualquer refilmagem um pouco duvidosa. A falta de identificação do trailer é estranha. No começo, parece tratar de uma comédia, depois passa para um pesado terror e finaliza como um movimentado longa de ação.

QUERO MATAR MEU CHEFE (HORRIBLE BOSSES), dirigido por Seth Gordon



Taí um exemplo de trailer bem-sucedido, “publicitariamente” falando. A história está clara (três amigos querem matar seus respectivos chefes), o tom está claro, os personagens estão claros. É interessante como o trailer mostra como um trunfo o uso de atores famosos (Kevin Spacey, Jennifer Aniston e Colin Farrell) em papéis inesperados. Mas também há espaço para rostos menos conhecidos (não tanto o caso de Jason Bateman, mas de Charlie Day e Jason Sudeikis). Mostra que existe um respeito pela comédia. O trailer deixa claro a utilização de uma fórmula de sucesso em um novo contexto, ou seja, a história dos “três amigos em uma encrenca”, muito bem usada em “Se Beber, Não Case!”, volta aqui com doses mais altas de humor negro. Quem já teve acesso ao roteiro, fala que é uma comédia promissora. E que o personagem de Jamie Foxx seria um dos mais hilários. A sua curta aparição na prévia não deixa de ser estranha.

MICHAEL, dirigido por Markus Schlenzer

Filmes, sejam de arte ou blockbusters, estão aí para serem assistidos. Óbvio que um buscará atrair o máximo possível de espectadores. O outro tentará fisgar um nicho mais específico de público. E, com isso, a forma de publicidade através do trailer é diferenciada. O de “Michael” é o caso de um trailer poderosíssimo que, como era de se esperar, foge completamente dos padrões hollywoodianos de marketing cinematográfico. Enquanto as prévias de filmes pipoca trabalham com o peso de seus protagonistas, sequências aceleradas, edição desenfreada e temas da moda, o de “Michael” trabalha com a sensação. É um filme austríaco que está em Cannes e tem a pedofilia como o tema central. A prévia nunca deixa o assunto muito claro, mas a sensação de “alguma coisa está errada” se torna constante a partir do segundo 50, quando a cortina é fechada. Daí, inicia uma série de sugestões que tornam o clima tenso (a arrumação da mesa e os diferentes copos utilizados é uma solução audiovisual muito eficaz). O poder da sugestão, entretanto, pode diminuir em duas horas de filme se não existir uma narrativa consistente que o sustente. Mas, enfim, é um trailer, como disse, poderoso.

É o longa de estreia de Markus Schlenzer, um veterano diretor de elenco, colaborador do genial Michael Haneke.
THE CHANGE-UP, dirigido por David Dobkin

O tema da comédia “The Change-Up” é mais batido do que uma continuação de “Jogos Mortais”. Personagens de personalidades diferentes trocam de corpo e um é obrigado a viver a vida do outro. O tema apenas não atrairia muita gente. Portanto, o trailer trabalha com o pedigree da proução: é do diretor de “Penetras Bons de Bico” e dos roteiristas de “Se Beber, Não Case!”. Isso, na cabeça dos produtores, seria garantia de boa comédia e o suficiente para fascinar o público. Pode até ser. Mas o trailer peca em não deixar clara a alma do negócio. Um dos grandes trunfos desse tipo de comédia são as atuações. “Se Eu Fosse Você” é um filme cheio de problemas, mas funciona porque é engraçado ver Tony Ramos com tiques femininos e Glórias Pires dando uma de machão. “Sexta-Feira Muito Louca” é um filme acima da média pelo ótimo trabalho de Jamie Lee Curtis na personalidade da personagem de Lindsay Lohan. No trailer de “The Change-Up”, a troca de corpos só é identificada por questões externas às interpretações. O que tira muito do charme.

THE FUTURE, dirigido por Miranda July

O trailer de “The Future”, segundo longa da artista Miranda July, se parece com o trailer de um filme de Miranda July. Parece óbvia a constatação, mas uma das peculiaridades de um trailer, que o diferencia da propaganda comum de intervalos comerciais da TV, é o fato de ser uma narrativa de dois minutos construída a partir da desconstrução e posterior reconstrução de uma narrativa de duas horas e meia. Ou seja, é preciso apresentar o filme, mas aumentar a dose de sedução para atrair o público em potencial. Dessa forma, nem sempre a prévia é completamente fiel ao longa completo. Quantas vezes você já viu um trailer que lhe deu a impressão de ser o filme mais sensacional de todos os tempos, mas, no fim das contas, é uma decepção? O trailer de “The Future” não te engana por nenhum momento: vende um filme de Miranda July. July é uma artista de diversas plataformas que discursa, principalmente, a conexão. Seu primeiro filme, “Eu, Você e Todos Nós”, impressionou muita gente e já deixou clara sua assinatura como cineasta, o que não é pouca coisa. Tem quem não goste e o trailer de “The Future” definitivamente não é para eles. É a história de um casal (July e Hamish Linkater) que resgata um gato e resolve adotá-lo. Porém, o bichano precisa ficar um mês no veterinário para vacinas e outros cuidados. É o tempo para cair e ficha e eles perceberem que suas vidas vão mudar com a responsabilidade que terão quando o gato for liberado. Ah, ponto importante: o filme é narrado pelo próprio gato.

LA PIEL QUE HABITO, dirigido por Pedro Almodóvar

Assim como o trailer de “The Future”, o de “La Piel que Habito” tenta seduzir através de sua assinatura: é um filme de Pedro Almodóvar. Mas há um detalhe a mais. Diferente de July, Almodóvar é cineasta há mais de 30 anos. Sua obra já foi pesquisada e discutida. O diretor espanhol transita por todos os gêneros sem se apegar às regras. Existe uma profundidade almodovariana em suas tentativas de brincar, questionar ou discutir o gênero. Temos no teaser de “La Piel Que Habito”, então, uma sensação de que uma obra voltada para o bizarro está por vir. Desde a imagem de um corpo feminino deitado e enfaixado até a mesma mulher mascarada que ameaça se matar e terminar com o brinquedo do personagem interpretado por Antonio Banderas. Então, se no trailer de “The Future” existe a assinatura de July, mas sem surpresas para quem espera um filme de Miranda July, no teaser de “La Piel Que Habito” identifica-se o universo almodovariano, mas existe um twist, que o torna muito interessante.

CARROS 2, dirigido por John Lasseter e Brad Lewis

Uma matéria da revista New Yorker levanta a seguinte questão: ninguém vai mais ao cinema por causa do estúdio. Eu não vou assistir um filme por ser da MGM ou da FOX. O único com esse poder de atração é a Pixar. Dessa forma, “Carros 2” é muito bem identificado como um filme da Pixar e da Disney, outro nome que chama a atenção. Eu, particularmente, não gosto do trailer, mas o entendo. Começa bem, com uma brincadeira com os filmes de espionagem, depois segue para uma sequência de cenas engraçadinhas ou aceleradas e não dá muita informação sobre o que se trata. E, normalmente, os filmes da Pixar são superiores por lidar com temas densos e poderosos de uma forma acessível e divertida. Acredito ser este o caso também. Talvez não fosse possível passar tal abordagem em um trailer. E no fim das contas, o nome Pixar já fala por si só. E o fato de todos já conhecerem os personagens ajuda a falta de um enredo identificável.

GIGANTES DE AÇO, dirigido por Shawn Levy

Um filme sobre esportes quase sempre, no cinemão hollywoodiano, significa chegar a níves estratosféricos de previsibilidade. Porém, para o público que deseja atingir o trailer de “Gigantes de Aço” é quase infalível. É a história de um lutador de boxe que cai no ostracismo quando robôs passam a substituir humanos no esporte. O filho, fascinado pelo pai e sua trajetória no esporte, pressiona-o a ensiná-lo. Iniciam uma saga para treinar um robô mais modesto, porém, claro, com um grande coração. Enfim, aquela coisa que a gente já sabe no que vai dar. O trailer deixa muito clara a mistura entre “Rocky” e “Transformers”. Estão lá as cenas de ação, os efeitos especiais, a criança espertona, o filme de superação, todos os ingredientes de um filme família bem-sucedido nas bilheterias. A previsibilidade do longa é jogada na nossa cara. Mas possivelmente quem vai assistí-lo não espera ser surpreendido. A confiança no filme é grande, afinal, a Dreamworks já encomendou uma continuação.

PREMONIÇÃO 5, dirigido por Steven Quale

Mortes criativas. Ponto final. É tudo que precisamos saber. Daí, você vê se vale a pena gastar dinheiro com isso.