Eu fiquei tão maravilhado e impressionado com “Mar Negro“, que sonhei com o filme após assisti-lo no Belas Artes, em BH, como parte da programação do festival INDIE 2013. E a sensação de assistir a mais este trabalho do diretor Rodrigo Aragão é realmente a de um delírio. São tantas iguarias cinematográficas reunidas, dosadas em cenas que vão do humor extraído de uma conversa de bêbado até a mais alucinante das cenas de ação, que você realmente se pega num estado de entusiasmo e perturbação típico de quando se está num desses pesadelos bons: tudo aquilo é grotesco, nojento, repulsivo, você quer sair dali, mas quando acorda achou tudo muito divertido.
Autor dos igualmente insanos “Mangue Negro” e “A Noite do Chupacabras”, Aragão constrói um filme de horror gore que pouco se ousa fazer hoje em dia no cinema comercial, nem mesmo no cinema americano, que nos 70 e 80 teve sua época de ouro e que Aragão busca referenciar o tempo todo, especialmente no uso descambado de efeitos especiais práticos. Na verdade, ele vai bem mais atrás no tempo, pois pode-se tirar dali homenagens a “Godzilla” e a “O Monstro da Lagoa Negra” (cabe ainda “O Dia em que a Terra Parou”, de Robert Wise), além da origem nos mortos-vivos de George A. Romero, é claro. Referências que não se limitam a serem meramente visuais, deve-se destacar, pois Aragão, em meio a tanta loucura, também busca a alegoria política. No caso, aponta para a exploração do petróleo no litoral brasileiro.
Voltando aos efeitos especiais, Aragão e sua equipe não têm a preocupação de que eles pareçam realistas ao extremo, coisa que a computação gráfica se propõe a fazer em 99% dos casos desde o início de sua supremacia na indústria a partir da metade dos anos 90. Porém, eles também não querem fazer com que os efeitos soem falsos. O que eles buscam é dar uma aparência diegeticamente real, ou seja, dentro daquele escopo, dentro do universo consciente de que aquele é um filme de terror barato, eles querem fazer com que os monstros, o sangue, as gosmas, as decapitações sejam críveis. Há de se ressaltar que é nítido (e natural) o aperfeiçoamento técnico em relação a “Mangue Negro”, mas é melhor não citar ou detalhar nada das cenas de violência, pois você merece se surpreender com o rumo que as coisas tomam, clímax atrás de clímax, culminando em um momento de absoluto espantamento e genialidade.
Imbuído também de referências folclóricas e culturais brasileiras, “Mar Negro” não é um filme: é um rolo compressor. É cinema de horror fantástico como há muito não se via, se é que já se viu ser feito no Brasil alguma vez, com todo respeito e reverência que se deve a José Mojica Marins. O “Zé do Caixão” já tem quem continuar seu legado na turma da qual Aragão faz parte, com sua produtora Fábulas Negras, localizada em Guarapari, no Espírito Santo. É um bravo que merece ser aplaudido e cumprimentado por todos os fãs do gênero.
ZOMBIE INDIE
O INDIE 2013 também exibe em sua programação, em BH, outros dois filmes de zumbi brasileiros: “Porto dos Mortos“, de Davi de Oliveira Pinheiro (o filme também está disponível no Netflix), e “Zombio 2: Chimarrão Zombies“, de Petter Baiestorf, da Canibal Filmes. São outros dois expoentes do gênero que mostram que a produção de longas está aumentando, já que em curta-metragem ela é bastante rica e esse pessoal merece ser descoberto por um público cada vez maior. ■