No último dia da CineOP, em plena segunda-feira, Ouro Preto já se mostra um pouco diferente, mais calma. Passado o final de semana, muitos turistas vão embora, deixando as ruas mais livres e menos tumultuadas. E assim o cotidiano normal da cidade aparece. O comércio, os moradores, a vida presente inserida num cenário de passado. É interessante o contraste visual entre a arquitetura da época colonial e a presença de carros diversos, de pessoas com as roupas atuais e das logomarcas de empresas que ocupam os prédios.
Mas Ouro Preto é uma cidade que se impõe. Nada tira seu charme e o peso da memória. As lindas montanhas avistadas no entorno contribuem para uma sensação de que você foi capturado por aquele lugar. Ele prende sua atenção de um forma intimidadora, inclusive. A leveza vem da luz, que adentra os morros e as esquinas, vem das cores, dos grafismos e detalhes únicos de cada construção. Essa cidade tem beleza, riqueza e uma personalidade sem igual. É preciso tempo para apreciá-la e refletir sobre ela. Assim como a mostra de cinema que lhe pertence.
Na programação de encerramento, o destaque durante o dia foi dos Encontros de Arquivos e de Educação. Participamos do seminário com o tema “Os Jovens e as Escolas de Luta: Educação, Estética e Política”, com uma mesa de convidados bastante interessante. A começar pelo diretor de “Acabou a Paz, Isto Aqui Vai Virar o Chile, Escolas Ocupadas em São Paulo”, Carlos Pronzato, que está sempre atento a importantes movimentos sociais e políticos da América Latina. Também teve a presença de dois professores, Cezar Migliorin e Pedro Henrique Oliveira Gomes, ambos do Rio de Janeiro e com projetos que fazem do cinema instrumento de educação, e do estudante Matheus Zanon, da ocupação Uerj.
Durante o debate falou-se principalmente sobre os significados das ocupações para o Brasil, como a mídia e o governo estadual foram resistentes e determinados a criminalizar o ato dos estudantes. Além disso, levantou-se a discussão sobre o quanto é preciso promover grandes mudanças no ensino e valorizar o ambiente das escolas. Uma educação mais crítica e moderna faz-se necessária, assim como a valorização e maior autonomia dos professores e alunos. Ficou evidente que que a chave para isso é o diálogo entre todos os agentes da comunidade escolar. Também discutiu-se o uso dos vídeos e da internet como registro e como “arma” de luta.
Mais tarde, importantes acontecimentos no âmbito da preservação audiovisual se sucederam, com destaque a eleição da nova diretoria da ABPA (Associação Brasileira de Preservação Audiovisual), a elaboração da nova Carta de Ouro Preto, que é anual e aponta a necessidade de manutenção dos projetos e das políticas mais urgentes a serem implementadas, e a finalização e entrega do Plano Nacional de Preservação Audiovisual. Após uma década de conversas a respeito, o texto do Plano se fixou em conformidade ao Plano Nacional de Cultura (PNC), especialmente em questões relativas a patrimônio cultural e direito à memória.
À noite, estivemos na sessão de “Festa”, filme pérola do cinema nacional, realizado em 1989, com direção de Ugo Giorgetti, que trata com humor e alegoria a fase em que o Brasil consolidava a Nova República, mas que seguia sendo estratificado e com desigualdades sociais que perduram até hoje. No encerramento, que aconteceu no Cine Vila Rica, foi apresentado o curta “Caminhos para as Pedras”, da Mostra Valores, produzido durante a CineOP e que lançou um olhar afetivo sobre a tradicional Feira de Pedra Sabão da cidade, onde trabalham artesãos de todas as idades.
O filme de encerramento foi o documentário “Crônica da Demolição”, de 2015, dirigido por Eduardo Ades. O longa conta a história por trás de uma praça vazia do Rio de Janeiro, que tem um chafariz seco e um estacionamento subterrâneo, mas que abrigou há 40 anos o Palácio Monroe, antiga sede do Senado Federal. Aos poucos vamos descobrindo o vazio deixado pelo Palácio e também por outros prédios de grande valor histórico que foram arbitrariamente demolidos. Muitas cenas de um antigo Rio de Janeiro se contrapõem a filmagens em alta definição do Rio de hoje. Entre um e outro, vários questionamentos sobre como a cidade se transformou ao longo dos anos.
No espaço de encontro noturno, as últimas apresentações musicais foram da banda Candonguêro, com muito forró e canções populares, e do DJ Hellthon, que colocou todo mundo para dançar ao som de hits do pop, rock e MPB. Foi uma espécie de confraternização final para celebrar o sucesso da mostra, que promoveu encontros, diálogos, muitas reflexões políticas, cinema da melhor qualidade, novos projetos educacionais e de preservação, entre muitas outras vivências e experiências. Resumindo, um evento completo, no cenário perfeito.
Abaixo, um pouco da exposição que esteve instalada no hall do Centro de Artes e Convenções desde o primeiro dia da CineOP até o último, apresentando as temáticas Preservação, História e Educação em imagens e textos e focando na abordagem desta edição do evento: Cinema, TV e Educação, com destaque aos homenageados Eduardo Coutinho e Chico Moreira.
Editora, crítica de cinema e podcaster do Cinematório. Filiada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e membra do Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema. Jornalista profissional pela UFMG e com formação em Produção de Moda pela mesma instituição. É cria dos anos 90 e do interior de Minas.