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Setembro Amarelo: o suicídio no cinema

Setembro Amarelo é uma campanha de conscientização sobre prevenção do suicídio com o objetivo direto de alertar a população a respeito da realidade do suicídio no Brasil e no mundo e suas formas de prevenção. No Brasil, é uma iniciativa do CVV (Centro de Valorização da Vida), CFM (Conselho Federal de Medicina) e ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria). O mês de setembro já está chegando ao fim, mas a conscientização deve acontecer sempre, dada a importância do tema, que é uma questão de saúde pública, levando 32 brasileiros por dia, mais do que o HIV ou muitos tipos de câncer, por exemplo. E, segundo a OMS — Organização Mundial de Saúde, o suicídio pode ser evitado em 90% dos casos. Portanto, é preciso saber mais e discutir sempre.

Um dos primeiros passos para a prevenção do suicídio é quebrar o tabu que envolve o assunto. Nesse sentido, o cinema e a TV têm grande importância na conscientização, no estímulo ao debate e no poder de criar empatia com aqueles que passam ou já passaram por situações de vulnerabilidade emocional e saúde mental fragilizada. Mas as produções audiovisuais também podem trazer representações controversas e certos gatilhos que devem ser evitados por quem tem pensamentos suicidas. Além disso, podem falhar na abordagem superficial do que é bastante complexo.

Recentemente, vimos surgir uma polêmica acerca do conteúdo da série “13 Reasons Why” (“Os 13 Porquês”, ouça nosso podcast), produção original da Netflix, pois ela aborda de maneira problemática o suicídio entre adolescentes. Embora tenha seus méritos em trazer à tona a discussão sobre o tema como um problema social sério — e também o bullying, o machismo e o abuso sexual – a obra comete alguns deslizes. A começar pela opção dos realizadores de detalhar e representar explicitamente o ato de suicídio da protagonista. A OMS recomenda que se evite descrever detalhes do método na ficção porque isso pode influenciar a maneira como os suicídios são realizados.

“13 Reasons Why”

Outro aspecto preocupante é que a série não enfatiza a saúde mental como causa, focando-se apenas nos motivos externos e no comportamento das pessoas à volta da personagem que comete suicídio, além de não fornecer nenhuma saída para ela. As pesquisas na área de saúde apontam que a maioria dos casos de suicídio decorrem de sofrimento mental e, segundo especialistas, uma das maiores causas para tentativas é a depressão. Sendo assim, acompanhamento profissional e tratamento são fundamentais para a prevenção dessas tentativas.

Mas se esse é um exemplo de série de TV controverso, existem outras produções audiovisuais ficcionais que são exemplos positivos e que merecem ser recomendadas por abordarem o suicídio de maneira sensível e responsável. Obras — baseadas ou não em casos reais — que podem ser um elo de compreensão e enfrentamento para todos.

Um desses bons exemplos é “Geração Prozac”, dirigido por Erik Skjoldbjærge e estrelado por Christina Ricci. Conta a história de Elizabeth Wurtzel, uma jovem que começa a estudar Jornalismo em Harvard e que luta contra a depressão. O filme é narrado sob o ponto de vista da protagonista e, assim, criamos uma relação empática com ela. As complexidades dos relacionamentos com a família, amigos e até mesmo com a terapeuta são bem exploradas, nunca caindo no maniqueísmo. Interessante também como o filme aborda a importância dos medicamentos, que muitas vezes são encarados com muito preconceito pela sociedade. E mesmo sendo uma narrativa que se aproxima bastante do real e não se intimida em ir fundo nos sentimentos da protagonista (afinal foi baseada num livro escrito pela própria Elizabeth), há o cuidado de mostrar saídas, as possibilidades de enfrentamento.

“Geração Prozac”

Outro exemplo interessante é “As Virgens Suicidas”, de Sofia Coppola. Neste filme muito sensível e ao mesmo tempo denso, um grupo de amigos adolescentes ficam encantados por cinco irmãs misteriosas que possuem pais rígidos, religiosos e superprotetores, em meados da década de 1970. Por conta dessa educação opressora e outros aspectos da própria sociedade, as irmãs perdem cada vez mais a liberdade de se expressar, de autodescoberta e da descoberta do mundo que as cerca.

Porém, o ponto de vista aqui não é das meninas, mas de um dos adolescentes que esteve perto delas e permaneceu rememorando suas vidas, tentando compreender o que aconteceu e se a tragédia, já anunciada no título do filme, poderia ter sido evitada. Por isso, nada é explicitado, não há cartas ou diálogos explicativos; os motivos ficam subentendidos às situações que as meninas vivem. O filme é certeiro ao comentar — de forma sutil, porém inteligível – sobre dogmas culturais, questões de gênero e sexualidade, sobre complexidades da psique humana e como as aparências enganam.

“As Virgens Suicidas”

Um terceiro exemplo notável é “As Vantagens de Ser Invisível”, de Stephen Chbosky, com Logan Lerman e Emma Watson no elenco. Filme doce e com profundidade sobre as inseguranças da adolescência, em que o protagonista é abalado após o suicídio de seu melhor amigo, além de carregar outros sentimentos negativos que o levam à depressão. Enfrentando suas dificuldades e traumas de infância, ele cria novos vínculos pessoais e amizades importantes que lhe dão amparo, mais força e motivação para novas vivências e perspectivas.

“As Vantagens de Ser Invisível”

Por fim, saindo do contexto da juventude, há “Canção da Volta”, longa-metragem brasileiro dirigido por Gustavo Rosa de Moura, com Marina Person (ouça entrevista) e João Miguel nos papéis principais. O filme traz narrativa complexa e um tom mais pesado, sendo o ponto de vista majoritariamente do homem, casado com uma mulher que já tentou suicídio. A família, incluindo os filhos, tentam superar esse fantasma, mas é nítido como estão desestruturados emocionalmente. Somos imersos na intimidade deles e é interessante perceber como não há a intenção do filme de vilanizar ou vitimizar ninguém. Todos os personagens são multidimensionais, mostrando suas nuances de desequilíbrio e também de superação.

O marido, que vai cada vez mais se entregando ao desejo obsessivo de controle e à paranoia, acaba levando o relacionamento com sua mulher ao sufocamento, ao conflito. Tudo parece volátil e muito frágil por conta da instabilidade emocional não só da mulher que enfrenta a depressão, mas também de quem está no entorno. Um retrato sincero de como é impossível entendermos o outro em sua totalidade, ao mesmo tempo em que nos faz refletir sobre a possibilidade de um caminho compartilhado se existir adaptação e, principalmente, espaço para o universo de cada um. Importante para a compreensão de que o enfrentamento do sofrimento mental é um trabalho conjunto.

“Canção da Volta”
“Canção da Volta”

Este artigo foi originalmente produzido para a Rádio Terceiro Andar, projeto da disciplina de Rádio e Mídias Digitais da Fafich-UFMG (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais).


“Falar é a melhor solução”

Para saber mais: www.setembroamarelo.org.br

Para conversar, apoio emocional e prevenção do suicídio: Centro de Valorização da Vida

(ou ligue 141)

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