Nesta edição do podcast, nós entrevistamos o quadrinista, ilustrador e cineasta britânico Dave McKean, que esteve no Brasil para o lançamento de sua mais nova graphic novel, “Black Dog: Os Sonhos de Paul Nash“. Na conversa com o cinematório, ele fala sobre o desenvolvimento da HQ, como transforma sonhos e fantasias em imagens, opina sobre o uso da tecnologia digital no cinema e a inundação de filmes de super-heróis nas salas.
Dave McKean é reconhecido principalmente pela parceria com o autor Neil Gaiman, com quem colaborou em muitos projetos: “Orquídea Negra” (1988), “Sinal e Ruído” (1990) e, claro, “Sandman”. Entre 1990 e 1996, Dave também escreveu e ilustrou o premiado romance “Cages”, que ganhou o Harvey Award de Melhor Nova Série e Melhor Graphic Novel. Mais tarde, ainda criou ilustrações conceituais para os filmes “Harry Potter e a Câmara Secreta” e “Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban”. Também no cinema, dirigiu os longas “Mirrormask – Máscara da Ilusão” (2005) e “Luna” (2014).
A entrevista foi produzida por Renato Silveira e Antônio Tinôco, com a colaboração de Leandro Luz, que foi quem conduziu a conversa, gravada no Rio de Janeiro. O áudio da entrevista está em inglês, mas logo abaixo você pode ler a tradução e a transcrição da conversa na íntegra.
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O cinematório café é produzido e apresentado por Renato Silveira e Raquel Gomes. A cada episódio, nós propomos um debate em torno de temas relacionados ao cinema e às suas áreas correlatas, sempre em um clima de descontração, mas buscando, acima de tudo, reflexões sobre imagens que estão presentes no nosso dia a dia.
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TRADUÇÃO E TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM DAVE MCKEAN:
“Black Dog” é uma graphic novel sobre o pintor inglês surrealista Paul Nash, baseada em suas lembranças da Primeira Guerra Mundial. De onde surgiu o seu interesse por esse tema em particular e como você se sente trabalhando com um personagem da vida real numa graphic novel?
“Black Dog” is a graphic novel about the surrealist English painter Paul Nash, based on his memories of the World War I. Where did your interest for this particular story came from and how do you feel working with a real-life character in a graphic novel?
Dave McKean: Bem, começou como uma encomenda. Me pediram para pensar, apresentar uma ideia para uma graphic novel sobre qualquer coisa relacionada com a Primeira Guerra Mundial. Não Paul Nash, particularmente, mas qualquer coisa. Mas eu pensei que seria interessante olhar para a guerra através dos olhos de uma pessoa. E eu pensei que essa pessoa deveria ser uma pessoa criativa, porque está em seu trabalho. Elas podem não falar sobre essas experiências na guerra, mas em sua obra ela não conseguem escapar. Eu pensei que o mais forte dos artistas de guerra era Paul Nash. Não necessariamente o melhor pintor. Não necessariamente… Ele não era o artista que teve a experiência mais dura da guerra. Mas ele parece ser a pessoa que voltou com as imagens mais poderosas. Eu conhecia o seu trabalho por causa da escola de artistas de quem ele era amigo, a primeira escola moderna de pintores britânicos. Eles não são realmente conhecidos fora da Inglaterra, mas são muito importantes na Inglaterra. Então, uma vez que eu decidi que Nash deveria ser o personagem central, eu li tudo e pesquisei tudo, realmente absorvi tanto a experiência de guerra quanto suas pinturas.
Dave McKean: Well, it started as a commission. I was asked to think about, pitching an idea for a graphic novel about anything to do with the First World War. Not Paul Nash, particularly, but anything. But I thought it would be interesting to look at the war through the eyes of one person. And I thought that one person should be a creative person, because it’s in their work. They may not talk about that experiences in the war, but in the work he can’t escape it. I thought the strongest of the war artists was Paul Nash. Not necessarily the best painter. Not necessarily… He wasn’t the artist who had the toughest experience in the war. But he seems to be the person who came back with the most powerful images. And so I knew of his work because of the school of artists he was friends with, the first modern school of British painters. They’re not really known outside England, but they’re very important in England. But once I’ve decided that Nash should be the central character, I read everything and look through everything and really absorbed both the war experience and also his paintings.
Você já havia tido algum contato com o trabalho dele antes de imaginar que iria escrever um livro?
Did you already have any contact with his work before you imagined that you were going to write a book?
Dave McKean: Bem, ele cresceu em uma parte da Inglaterra onde eu cresci, então eu reconheci a paisagem que ele pintou. Depois da guerra, ele se mudou para o lugar em que eu moro agora, então eu reconheci essas paisagens também. E assim houve o início de uma conexão e, quanto mais eu lia sobre ele… Ele perdeu a mãe quando era criança, eu perdi meu pai quando era criança. Houve muitas, muitas pequenas conexões e então eu comecei a ter uma noção do homem.
Dave McKean: Well, he grew up in a part of England where I grew up, so I recognized the landscape that he painted. After the war, he moved to the place that I live now, so I recognized those landscapes as well. And so there was a start of a connection, and then the more I read about him… He lost his mother when he was a child, I lost my father when I was a child. There was many, many little connections that I started to get a sense of the man.
Também sobre essa conexão, eu ainda tenho que ler “Black Dog” inteiro, mas eu gostaria que você me dissesse o quanto da obra de Paul Nash influenciou o design visual para a graphic novel e se existe no pintor uma inspiração para o seu estilo artístico em outros dos seus trabalhos?
Also about this connection, I still have to read the entire book, “Black Dog”, but I’d like you to tell me how much of Paul Nash’s own work influenced the visual design for the graphic novel and whether there is in the painter an inspiration for your artistic style in other works?
Dave McKean: Bem, eu não queria apenas fazer versões desenhadas de suas pinturas. E também não queria apenas fazer um livro cheio das minhas imagens, que não tinham nada, nenhuma relação com Nash. Então, é muito mais uma conversa. Eu pensei que seria interessante, ao invés de apenas fazer uma biografia direta, fazer uma sequência de sonhos. Porque as pinturas de Nash parecem sonhos. Elas não são realistas. São interpretações do mundo. Portanto, [“Black Dog”] é uma série de sonhos em que cada capítulo inclui acontecimentos reais da vida de Nash e da guerra e de várias coisas, mas eles foram interpretados, eles foram colocados juntos de maneiras incomuns. Da maneira como os sonhos fazem isso. E essa estrutura me permitiu interrogar Nash, falar com Nash mais diretamente. Eu tinha algumas perguntas que queria respostas. Então eu pensei que seria uma estrutura interessante. Assim as imagens finais se relacionam com Nash, até a capa, essa estilização da lama, é muito inspirada em Nash, mas a imagem toda não é.
Dave McKean: Well, I didn’t want to just do traced versions of his paintings. And also I didn’t want to just do a book full of my images that had nothing, no relations with Nash at all. So it’s very much a conversation. And so I thought it would be interesting, rather than just do a straight biography, to do a sequence of dreams. Because Nash’s paintings looks like dreams. They’re not realistic. They’re interpretations of the world. So [“Black Dog”] is a series of dreams where each chapter includes actual facts from Nash’s life and from the war and from various things, but they’ve been interpreted, they’ve been put together in unusual ways. The way dreams do that. And that structure allowed me to interrogate Nash, to talk to Nash more directly. I had some questions I wanted answered. So I thought that would be an interesting structure. So the final images relate to Nash, even the cover, this stylization of the mud is very inspired by Nash, but the whole image is not.
As cores no livro…
The colors in the book…
Dave McKean: As cores neste tipo particular de estilização. Mas a imagem inteira é minha. Não é uma pintura de Nash. Você não verá nada parecido na pintura de Nash. Então, é muito mais um diálogo entre nós.
Dave McKean: The colors in this particular sort of stylization. But the whole image is mine. It’s not a Nash painting. You won’t see anything like that in the Nash painting. So it’s very much a dialogue between us.
Você mencionou sonhos. E Luis Buñuel disse uma vez que tinha uma lista de 15 sonhos recorrentes que o perseguiram a vida inteira como companheiros fiéis de viagem. Seus trabalhos também têm uma espécie e veia onírica muito forte. Qual a sua relação com os sonhos? Você costuma tê-los frequentemente? Já colocou alguns deles no papel ou na tela?
You’ve mentioned dreams. And Luis Buñuel once said that he had a list of 15 recurring dreams that haunted him all his life as faithful travelling companions. Your works also have a very strong sort of dreamy vein. What is your relationship with dreams? Do you have them often? Have you ever put some of them on paper or on the screen?
Dave McKean: Sim, eu coloquei alguns sonhos diretamente em meus quadrinhos e filmes. Mas não são apenas sonhos. Estou interessado em nossas mentes, no modo como nossas mentes funcionam. Estou interessado em tudo o que envolve isso. Esses pequenos momentos são fatos agora. Isso é a realidade agora, como está acontecendo agora. Mas, você sabe, 4 horas atrás você teve a sua vida, eu tive a minha vida. Elas já estão desaparecendo. Nós nos lembramos vagamente do que aconteceu enquanto elas estão desaparecendo. Daqui a 4 horas você se lembrará desta conversa de um jeito, eu vou lembrar de um jeito um pouco diferente, então, ela já está perdendo sua adesão na realidade, e assim se forma a nossa vida imaginativa. Os sonhos fazem parte disso, mas também nossas esperanças do futuro, nossas memórias do passado, nossas interpretações errôneas das coisas. É uma grande tigela de irrealidade ou imaginação em torno dos pequenos momentos da realidade. Então, estou interessado nisso, na verdade.
Dave McKean: Yes, I put some dreams directly into my comics and films. But it’s not just dreams. I’m interested in our minds, in the way our minds work. I’m interested in everything that surrounds this. These little moments are facts now. This is reality now, as it’s happening now. But, you know, 4 hours ago you had your life, I had my life. They’re already fading. You know, we vaguely remember what happened when they’re fading. In 4 hours time you’ll remember this conversation one way, I’ll remember slightly differently, so already it’s losing its grip on reality and so becomes our imaginative lives. Dreams are part of that, but also our hopes of the future, our memories of the past, our misinterpretations of things. It’s a big bowl of unreality or imagination around the little moments of reality. So I’m interested in that, really.
Quando falamos sobre sonhos, também nos lembramos, obviamente, do que David Lynch pensa sobre sonhos e sobre como ele colocou essas coisas na obra dele… É ótimo entender como isso de fato entra no seu trabalho.
When we talk about dreams, we also remember, obviously, of David Lynch’s own thoughts about dreams and about how he put these things on his work… It’s nice to understand how this actually enters in your own work.
Dave McKean: Sim, e acho que [sonhos] são interessantes apenas no que eles nos dizem sobre nós mesmos. Eu não estou interessado em imagens fantásticas e sonhos malucos só por serem assim. O interessante é entender por que estão lá. O que estão nos dizendo sobre a realidade. Contanto que estejam ancorados na realidade e na psicologia de pessoas reais, então estou interessado.
Dave McKean: Yeah, and I think that [dreams] are]interesting only in what they tell us about ourselves. I’m not really interested in fantastical images and crazy dreams for the sake of it. The interesting thing is looking why they’re there. What they’re telling us about the reality. So long is that anchored in reality and the psychology of real people, then I’m interested.
Uma página em branco nos quadrinhos tem o potencial de receber qualquer ideia, por maior que ela seja. Já o cinema tem as suas limitações, principalmente financeiras. Jodorowsky, o cineasta, por exemplo, tentou adaptar “Duna” para o cinema e acabou tendo que recorrer aos quadrinhos para contar a história…
A blank page in comics has the potential to get any idea, however big it may be. But cinema has its own limitations, mainly financial. Jodorowsky, the film director, for example, tried to adapt “Dune” to the big screen but ended up having to resort to comics to tell the story…
Dave McKean: Quase. Ele quase chegou lá.
Dave McKean: Nearly. He nearly got there.
Sim. E ele acabou tendo que ir aos quadrinhos para contar a história que a gente lê em “Incal”.
Yeah. And he actually ended up having to resort to comics to tell the story we read in “Incal”.
Dave McKean: Sim, “Incal”… Inspirado naquilo.
Dave McKean: Yeah, the “Incal”… inspired by that.
Você, além de quadrinista, também é um cineasta. Você sente que tem mais poder como um ilustrador de quadrinhos do que como um diretor?
You are also a filmmaker, so do you feel you have more power as an illustrator than as a director?
Dave McKean: Sim, completamente. Eu poderia fazer um livro como este acontecer. Eu poderia pensar em alguma coisa agora e hoje à noite eu posso começar. Eu não tenho que pedir permissão a ninguém. Não preciso de orçamento, não preciso de atores. Eu não preciso de uma equipe. Eu não preciso de sistemas de distribuição. Eu poderia apenas fazer. Eu adoro fazer filmes… Eu gosto do processo de fazer filmes. Eu não gosto do negócio dos filmes. Eu não gusto dos intermináveis e de tentar conseguir o dinheiro. Eu não gosto de nada disso. E eu não gosto da distribuição restrita depois. Mas gosto do processo. Eu gosto de filmar, mas amo editar e amo fazer a música, colocar músicas em imagens. Mas é extremamente frustrante. Há uma enorme frustração em troca desses pequenos momentos dourados de criatividade. Sendo que fazer [quadrinhos] é tudo criatividade. Talvez um pouquinho de frustração em algum lugar, mas é principalmente criatividade.
Dave McKean: Yeah, completely. I could make a book like this happen. I could think of something now and tonight I can start it. I don’t have to ask anybody’s permission. I don’t need a budget, I don’t need actors. I don’t need a crew. I don’t need distribution systems. I could just do it. I love making films… I like the process of making films. I don’t like the business of films. I don’t love the endless lunches and trying to set the money up. I don’t like any of that. And I don’t like the restricted distribution afterwards. But I like the process. I like shooting, but I love editing and I love making the music, putting music to pictures. But it’s hugely frustrating. There’s a huge amount of frustration for this little golden moments of creativity. Whereas making [comics] is all creativity. You know, maybe one tiny bit of frustration somewhere, but it’s mostly creativity.
Depois ou durante o processo? A frustração surge quando?
After or during the making of… The frustration, when did it…
Dave McKean: Quero dizer, eu quase inventei isso, porque [“Black Dog”] foi completamente maravilhoso. Você sabe, alguns… Um ou dois dos capítulos eu comecei em um estilo e depois perdi a confiança e tive que jogá-los fora. Então, isso é um pouco frustrante. Mas de uma maneira completamente criativa, eu estava livre para fazer isso. Em um filme, não há como eu filmar cenas inteiras e depois dizer: “Eu não gostei, vou jogar fora”. É muito caro. Você simplesmente não pode fazer isso. Talvez Woody Allen possa fazer…
Dave McKean: I mean, I almost made that up, because [“Black Dog”] was completely wonderful. You know, a couple… One or two of the chapters I started in one style and then lost faith and I had to throw them away. So that’s slightly frustrating. But in a completely creative way, I was free to do that. On a film, there’s no way I could really shoot whole scenes and then go, “I didn’t like it, I’ll throw it away”. It’s too expensive. You just can’t do that. Maybe Woody Allen could do that…
Em uma entrevista no DVD de “Máscara da Ilusão”, você fala que considera o meio digital o próximo grande passo na evolução da arte cinematográfica, pelas inúmeras possibilidades que ele abre para a criação de um filme com um Mac em casa, por exemplo.
In an interview on the “MirrorMask” DVD you say that the digital medium is the next big step in the evolution of cinematic art, for the infinity possibilities it opens…
Dave McKean: É “um” grande passo. Digo, não é “o” grande passo, mas é “um” grande passo na evolução.
Dave McKean: It’s “a” big step. I mean, it’s not “the”, but it’s “a” big evolution step.
Correto. Você falou isso quase 15 anos atrás, então, hoje, como você tem visto o uso da tecnologia digital no cinema?
You said that almost 15 years ago, so, today, how have you seen the use of digital technology in cinema?
Dave McKean: Sim, eu falei. E bem… Eu obviamente não estou interessado em ferramentas digitais fazendo inúmeros dinossauros e super-heróis. Eu me interesso em ferramentas digitais mostrando, permitindo que você veja dentro da mente dos criadores. Então, penso que pessoas como Michel Gondry, Spike Jonze e, você sabe, uma porção de outros diretores estão realmente usando as ferramentas digitais de uma maneira interessante.
Dave McKean: I did, yeah. Well.. I’m obviously not interested in digital tools making endless dinosaurs and super heroes. I am interested in digital tools showing, allowing you to see inside the creators mind. So I think people like Michel Gondry, Spike Jonze and… You know, a hand full of other directors is really using digital tools in an interesting way.
Também Leos Carax, o cineasta francês que fez “Holy Motors” e “Os Amantes de Pont-Neuf”.
Also Leos Carax, the French filmmaker who made “Holy Motors” and “The Lovers of Pont-Neuf”.
Dave McKean: Sim, claro. E há vários outros. Tem um filme recente chamado “The Fall” [“Dublê de Anjo” no Brasil], de Tarsem Singh, que eu realmente achei lindo. Mas há muitos. David Lynch também. Não tão digital assim, mas…
Dave McKean: Yes, of course. And there been several others. There was a film recently called “The Fall”, by Tarsem Singh, which I really thought it was beautiful. But there are many. David Lynch as well. Not digital so much, but…
Vislumbres do digital em “Twin Peaks”…
Glimpses of digital in “Twin Peaks”…
Dave McKean: Sim, isso é um uso interessante da mídia digital. Mas não foi usado com a potência como eu pensei que fosse. Há uma busca contínua pelo realismo. E acho que esse é um objetivo muito restrito. Há todo um mundo de expressionismo e impressionismo que poderíamos explorar, mas eles ainda estão tentando fazer pessoas realistas, o que é uma pena.
Dave McKean: Yeah, so that’s an interesting use of digital media. But it hasn’t been used as powerfully as I thought it was going to. There’s a continual pursuit for realism. And I think that’s a very narrow target. There’s a whole world of expressionism and impressionism that we could explore, but they’re still trying to make realistic people, which is a shame.
Dave McKean: Sobre esse realismo, o diretor Ari Folman lançou recentemente um quadrinho baseado em “O Diário de Anne Frank” e está preparando a adaptação para o cinema como um filme animado. Você já pensou em adaptar alguma de suas graphic novels para o cinema? Talvez, assim como Folman faz, em formato de animação?
Dave McKean: About this realism, film director Ari Folman has recently released a comic based on “The Diary of Anne Frank” and he is preparing a film adaptation as an animated feature. Have you ever thought about adapting any of your graphic novels to the big screen? Maybe, just like Folman, in animation format?
Dave McKean: Sim, eu escrevi dez rascunhos do roteiro para “Sinal e Ruído”, o livro que fiz com Neil Gaiman. Há uma ideia… A ideia central do livro, eu ainda amo muito: o que fazemos com o tempo que nos resta, e se de repente você acha que tem pouco tempo, isso mudaria suas prioridades? E se isso mudar suas prioridades, o que você faria em seguida? Eu adoro essa pergunta. Mas nós não fizemos justiça a essa pergunta com o livro. Então eu escrevi um filme que realmente expande isso. Mas, novamente, eu cheguei muito perto de fazê-lo. Eu tive um grande produtor, Guillermo Del Toro produzindo em um momento. Eu tinha Alfred Molina estrelando. Um monte de coisas, mas eu não conseguia arrumar o dinheiro necessário. Não funcionou.
Dave McKean: Yeah, I wrote ten drafts of script for “Signal to Noise”, the book I did with Neil Gaiman. There is an idea… The idea, the center of the book, I still really love: what do we do with our remaining time, and if you suddenly find you got very little time, does that change your priorities? And if it does change your priorities, what would you do next? I love that question. But we did not do that question justice, with the book. So I have written a film that really expands it. But, again, I got very close to get it made, I had a great producer. Guillermo Del Toro producing in one point. I had Alfred Molina starring in it. A whole bunch of things, but I just couldn’t get the money into place. It didn’t work.
Problemas da indústria e frustrações…
Industry problems and frustrations…
Dave McKean: Portanto, aquele projeto foi provavelmente… Aquele é o que vem à mente agora. Eu adoraria ter feito esse filme. Eu ainda tenho que fazer esse filme.
Dave McKean: So that’s probably… That’s the one that comes to mind. I would love to make that film. I still have to make that film.
Sobre adaptações de HQs para o cinema, elas se tornaram uma epidemia em Hollywood e parece que os estúdios se tornaram reféns delas. Raramente roteiros originais, como os de Guillermo Del Toro, são produzidos e tudo que sai de lá são filmes de super-heróis ou adaptações de outros materiais. Qual sua opinião sobre esses filmes?
On movie adaptations of comics, they have become an epidemic in Hollywood and it seems that the studios have become very dependent of them. Rarely original scripts, like Del Toro’s, are produced and everything that comes out of there are superhero movies or adaptations of other materials. What is your opinion on these films?
Dave McKean: Eu não gosto de nenhum dos filmes de super-herói, de forma alguma. Eu reconheço que alguns são muito bem feitos. Os filmes de Chris Nolan são muito bem feitos. E alguns são uma porcaria completa. Mas de modo geral eu simplesmente não gosto de nenhum deles. Os [filmes] que estão sendo feitos a partir de quadrinhos podem ser bons. Digo, eu achei que “Anti-Herói Americano” foi um ótimo filme. E embora sua relação com os quadrinhos seja nebulosa, “Estrada Para Perdição” é um bom filme baseado em quadrinhos. E esse novo, “A Morte de Stalin”, é adaptado de uma história em quadrinhos. É ótimo. É um roteiro muito engraçado. Então, existiu fonte para ideias de filmes. Eu acho que o que está acontecendo, obviamente, são os infinitos filmes de super-heróis, mas também há muitos quadrinhos sendo feitos, basicamente, como documentos de pitch. Você sabe, há storyboards e documentos de pitch para o acordo para fazer o filme. A história em quadrinhos é apenas uma espécie de… Meio para chegar a um fim. Eu realmente não gosto disso. Eu gosto de quadrinhos que são feitos para serem quadrinhos e filmes que são feitos para serem filmes.
Dave McKean: I don’t like any of the superhero films, at all. I recognize that some are very well made. Chris Nolan’s films are very well made. And some are complete crap. But on principal I just don’t like any of them. The [movies] that are being made from comics can be good. I mean, I thought “American Splendor” was a terrific film. And although its relationship to the comic is nebulous, “Road to Perdition” is a good film based on a comic. And the new one, “The Death of Stalin”, is adapted from a comic. It’s great. It’s a really funny script. So, there was source for ideas for films. I think what is happening, obviously, is the endless superhero films, but also there’s a lot of comics being made, basically being made as pitch documents. You know, there are storyboards and pitch documents for the film deal. The comic is just sort a… Means to an end. I really don’t like that. I like comics that are made to be comics and films that are made to be films.
Falando do seu próprio trabalho, o que você acha de uma possível, ou impossível, adaptação de “Sandman” para o cinema? Há anos fala-se nisso entre os fãs, mas nunca um estúdio chega perto de levar adiante.
What do you think of a possible, or impossible, film version of “Sandman”? For years it’s been talked about among fans, but never a studio comes close to do it.
Dave McKean: Eu realmente não tenho uma opinião sobre isso. Você sabe, eu acho que há algumas coisas… É um pouco como a trilogia “Fronteiras do Universo”, “A Bússola de Ouro”… Há livros sobre ideias. Literariamente você pode ir até o fim com eles, mas não são realmente adequados para serem filmes. Eles são ótimos, eles funcionam bem como quadrinhos. Então deixe-os serem quadrinhos, sabe? Se você quer fazer algo assim, pense em algo original. Então, pessoalmente, eu ficaria muito mais feliz se eles simplesmente deixassem [“Sandman”] em paz.
Dave McKean: I don’t really have an opinion on it. You know, I think there’re some things… It’s a bit like “His Dark Materials” trilogy, “Northern Lights”… There are books that are about ideas. Literarily you can sit through it, but they’re not really suit to be films. They’re fine, they work fine as comics. Leave it as a comic, you know? If you wanna do something like that, think of something original. So, personally, I’d be much happier if they just leave [“Sandman”] alone.
Em uma entrevista você disse algo que me chamou atenção: que a sua admiração pelos filmes de Woody Allen está presente em “Luna”, seu último longa que, infelizmente, não foi lançado no Brasil. Você diria que “Luna” tem um pouco de filmes do Allen como “Interiores” ou “Maridos e Esposas”, por exemplo?
In an interview you said something that caught my attention: that your admiration for Woody Allen’s films is present in “Luna”, you last feature film that, unfortunately, was not released in Brazil. Would you say that “Luna” has a bit of Allen films like “Interiors” or “Husbands and Wives”, for example?
Dave McKean: Bom, eu só posso ter esperança de que possa ter algo disso lá… Certamente de algo como “Maridos e Esposas”, que eu acho que é um dos seus melhores filmes. E “Crimes e Pecados” é outro que eu acho extraordinário. Quer dizer, eu amo tanto a seriedade de seus filmes quanto o humor. O humor da vida em seus filmes. Ele também foi minha porta de entrada para muitas outras pessoas, então, quando eu era muito jovem, encontrei seus filmes e, em seguida, descobri Bergman e Fellini e todos os outros. Ele foi como uma porta de entrada para uma maior compreensão do cinema. É por isso que eu amo esses filmes, na verdade. Por um longo tempo “Memórias” foi o meu favorito.
Dave McKean: Well, I would only hope that it might have something of… Certainly something like “Husbands and Wives”, which I think it’s one of his best films. And “Crimes and Misdemeanors” is another one I think is extraordinary. I mean, I love both the seriousness of his films and the humor. The humor at life in his films. He also was my gateway to a lot of other people, so, when I was very young, I found his films and then discovered Bergman and Fellini and all of the others. He was my sort of gateway to a bigger understanding of film. That’s why I love these films, really. For a long time “Stardust Memories” was my favorite.
É adorável. Uma última pergunta: o que vem a seguir para Dave McKean nos quadrinhos e no cinema?
It’s lovely. One last question, what’s next for Dave McKean in comics and in movies?
Dave McKean: Nos quadrinhos é fácil. Eu terminei um livro, um livro polêmico com um escritor americano chamado Jack Gantos. E esse sairá pela [editor] Abrams no início do próximo ano. E eu estou prestes a começar um novo livro para a Dark Horse que é um livro meu, eu escrevi, que é sobre… Monstros políticos. E por muito tempo eu tenho trabalhado em uma espécie de versão estranha de um filme alemão chamado “O Gabinete do Dr. Caligari”, minha própria versão disso. Chama-se “Caligaro”. Eu tenho um longo caminho para percorrer com esse, mas sairá em algum momento. E no cinema, eu fiz um quarto longa-metragem, chamado “Wolf’s Child”. E eu estou montando. Lentamente e alegremente, estou montando esse no momento.
Dave McKean: In comics is easy. I finished a book, a controversial book with an American writer called Jack Gantos. And that’s out from Abrams early next year. And then I’m just about to start a new book for Dark Horse that is my own book, I’ve written, that is about… Political monsters. And for a long time I’ve been working on a sort of strange version of a German film called “The Cabinet of Dr. Caligari”, my own version of that. It’s called “Caligaro”. I’ve got a long way to get with that, but that would be out at some point. And then in films, I’ve shot a fourth film, it’s called “Wolf’s Child”. And I’m editing it. Slowly and cheerily, I’m editing it at the moment.
Hyperlinks deste episódio:
— Prévia de “Black Dog”:
— Trailer “Mirrormask – Máscara da Ilusão”:
— Trailer “Luna”: