Há exatamente 50 anos, no dia 13 de dezembro de 1968, era decretado o Ato Institucional Nº 5, o AI-5, expressão máxima da ditadura militar no Brasil, assinado pelo então presidente Costa e Silva. Era o início de um período sombrio de institucionalização da repressão, intolerância e autoritarismo, que teve profundas reverberações em todos os âmbitos da sociedade, sendo decisivo para a área cultural e para a produção cinematográfica nacional.
Mas, desde seu início, o ano de 1968 já vinha sendo marcado por muita agitação política, não só no Brasil, como também em outros partes do mundo, a exemplo de Maio de 68, na França. Diante de todo esse contexto de tensões e mudanças tão significativas, revisitar o cinema realizado na época acaba sendo um resgate importante para melhor compreensão de como foi esse passado e como ele ecoa ou dialoga com o que vivemos hoje, especialmente em relação aos retrocessos em questões sociais e ameaças de novos cerceamentos da liberdade de expressão e direitos humanos.
A Mostra Cineclube Comum: Brasil 68, que começa hoje, dia 13, e vai até dia 21 de dezembro, no MIS Cine Santa Tereza, em Belo Horizonte, apresenta uma seleção de 12 filmes nacionais realizados naquele período, sendo muitos deles, inclusive, impedidos de chegar ao público devido à censura.
Segundo o curador da mostra, Victor Guimarães, a gravidade dessa experiência histórica brasileira influenciou uma série de mudanças no cinema nacional, tais como: a reformulação dos pressupostos do Cinema Novo, com a revisão das representações da experiência popular, como se pode ver em “Garota de Ipanema” (1967), de Leon Hirszman; intensificação das reflexões sobre a derrota política, como em “O Bravo Guerreiro” (1969), de Gustavo Dahl; surgimento do chamado Cinema Marginal, atravessado pelo desespero diante da repressão, do qual um dos expoentes é “Meteorango Kid, um Herói Intergalático”, de André Luiz Oliveira (1969); e o fortalecimento dos trânsitos entre vanguarda política e experimentalismo estético, como se pode perceber em “Jardim das Espumas”, de Luiz Rosemberg Filho (1970).
Todos esses títulos estão entre os selecionados para exibição gratuita no MIS Cine Santa Tereza e revelam a relação intrínseca entre a história do país e a arte cinematográfica. A mostra também aposta em filmes menos canônicos dessa época, com atenção especial às obras que, censuradas, só puderam ser exibidas muitos anos depois. A programação inclui, ainda, o único longa do crítico e cineasta mineiro Maurício Gomes Leite, “A Vida Provisória” (1968), raramente exibido na cidade; “Antes, o Verão” (1968), de Gerson Tavares, recentemente redescoberto e restaurado; e “Desesperato” (1968), de Sergio Bernardes Filho, que teve sua circulação proibida pelo regime. Além disso, serão exibidos filmes raros produzidos por mulheres naquele momento, casos de “Rosa Rosae” (1968), da mineira Rosa Maria Antuña, e de “A Entrevista” (1967) e “Meio-Dia” (1969) de Helena Solberg.
Conforme informações da assessoria de imprensa da Fundação Municipal de Cultura, a realização da mostra é do Cineclube Comum através do edital de seleção para uso dos espaços do Museu da Imagem e do Som de Belo Horizonte. Todas as sessões serão comentadas por pesquisadores e pesquisadoras, críticos e críticas de cinema atuantes na cena belo-horizontina, enriquecendo ainda mais a experiência e os debates que o filmes suscitam.
Confira a programação completa:
13/12 – QUINTA-FEIRA, ÀS 19h30
Rosa Rosae (Rosa Maria Antuña| Brasil | 1968 | 5 min)
A Vida Provisória (Maurício Gomes Leite | Brasil | 1968 | Drama | 8 min)
Classificação indicativa: 16 anos
*Sessão comentada por Rubens Gomes Leite e pelo curador da mostra Victor Guimarães
14/12 – SEXTA-FEIRA, ÀS 19h30
A Entrevista (Helena Solberg | Brasil | 1967 | 19 min)
Garota de Ipanema (Leon Hirszman | Brasil |Musical | 1967 | 89 min)
*Sessão comentada por Carla Italiano
15/12 – SÁBADO, ÀS 19h
Um clássico, dois em casa, nenhum jogo fora (Djalma Limongi Batista| Brasil|1968|Drama|30 min)
Blablablá (Andrea Tonacci| Brasil | 1968 | 33 min)
Classificação: 14 anos.
*Sessão comentada por Luís Fernando Moura
16/12 – DOMINGO, ÀS 19h
Meio-Dia (Helena Solberg | Brasil | 1969 | Ficção | 10 min)
Desesperato (Sérgio Bernardes | Brasil | 1968 | Drama | 100 min)
*Sessão comentada por Maria Trika
16/12 – DOMINGO, ÀS 17h
Meteorango Kid, o Herói Intergalático (André Luiz Oliveira | Brasil | Comédia |1969 | 85 min)
Classificação indicativa: 16 anos.
*Sessão comentada por Ana Luísa Coimbra
19/12 – QUARTA-FEIRA, ÀS 19h30
Antes, o Verão (Gerson Tavares | Brasil | Drama| 1968 | 80 min)
*Sessão comentada por Victor Guimarães
20/12 – QUINTA-FEIRA, ÀS 19h30
O Bravo Guerreiro (Gustavo Dahl | Brasil | Drama |1969 | 99 min)
Classificação indicativa: 18 anos.
*Sessão comentada por Vinícius Andrade
21/12 – SEXTA-FEIRA, ÀS 19h
Jardim das Espumas (Luiz Rosemberg Filho | Brasil | Ficção Científica | 1970 | 120 min)
Classificação indicativa: 18 anos.
*Sessão comentada por Letícia Marotta
SERVIÇO
Mostra Cineclube Comum: Brasil 68
De 13 a 21 de dezembro
MIS Cine Santa Tereza: Rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza – Praça Duque de Caxias
ENTRADA GRATUITA
Informações para o público: (31) 3277-4699 ou site.
Editora, crítica de cinema e podcaster do Cinematório. Filiada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e membra do Elviras – Coletivo de Mulheres Críticas de Cinema. Jornalista profissional pela UFMG e com formação em Produção de Moda pela mesma instituição. É cria dos anos 90 e do interior de Minas.