O encerramento da 22ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes aconteceu no sábado, dia 26 de janeiro, com a cerimônia de entrega dos prêmios do Júri da Crítica, Júri Popular e Júri do Canal Brasil. Na Mostra Aurora, dedicada a filmes inéditos de realizadores em início de carreira, o grande vencedor foi “Vermelha”, longa-metragem goiano dirigido por Getúlio Ribeiro que, fazendo jus à tradição da competitiva de destacar a experimentação de formas, apresentou uma obra inventiva e inusitada. O diretor criou um universo particular, aparentemente simples, porém muito sofisticado em sua construção, com personagens interpretados por sua própria família numa narrativa ousada e divertida, mas que também causa estranhamento e uma certa confusão na busca por sentidos.
Outro filme de Goiás que se destacou foi “Parque Oeste”, de Fabiana Assis, que levou o Prêmio Carlos Reichenbach, entregue pelo Júri Jovem da Mostra Olhos Livres. Guiado pela personagem central de uma mulher que resiste na luta por moradia, o documentário narra uma violenta desocupação ocorrida em Goiânia no ano de 2005. As cenas são fortes, tamanha a truculência policial registrada por câmeras caseiras. Uma verdadeira zona de guerra que não ganhou destaque na mídia hegemônica, mas que o cinema resgata de forma visceral.
Entre os curtas, “Negrum3”, de Diego Paulino, ganhou tanto o prêmio do Júri Popular quanto o prêmio do Júri do Canal Brasil, confirmando a recepção calorosa do público presente em sua exibição. O filme propõe um mergulho estético e empoderador sobre a negritude, mesclando formatos e se inspirando em afrofuturismo e videoclipes. Já o Júri da Crítica escolheu premiar “Caetana”, de Caio Bernardo, construído com poucos diálogos e foco nos gestos e pequenos atos de um rito social interiorano.
O Júri Popular também escolheu a produção carioca “Meu Nome é Daniel”, de Daniel Gonçalves, como melhor longa-metragem. O filme é uma autobiografia em que o cineasta traça o caminho de sua vida para tentar compreender sua condição de pessoa com deficiência. A narrativa se faz a partir de imagens de arquivo da família e de cenas gravadas que compartilham momentos, histórias e reflexões de Daniel. Em seu agradecimento pelo prêmio no Cine-Tenda, ele chamou a atenção para a importância do que isso representa. “Deve ser a primeira vez que uma pessoa com deficiência conta a sua própria história no cinema”, celebrou.
O Prêmio Helena Ignez de destaque feminino foi entregue a Cristina Amaral, pelo maravilhoso trabalho de montagem em “Um Filme de Verão”, de Jô Serfaty. A diretora, inclusive, foi quem recebeu o prêmio na cerimônia, pois Cristina não estava presente. O longa encerrou muito bem a Mostra Aurora, com sua criatividade e afetuosidade ao retratar o cotidiano e os sonhos de adolescentes da comunidade de Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Uma obra coletiva e horizontal, que diverte e emociona, ao mesmo tempo que fala de questões políticas através de uma representação sem estereótipos da periferia e seus jovens.
Confira abaixo todos os filmes premiados da 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes e a justificativa dos júris para os prêmios concedidos:
– Melhor longa-metragem Júri Popular: Meu Nome é Daniel (RJ), de Daniel Gonçalves.
– Melhor curta-metragem Júri Popular: Negrum3 (SP), de Diego Paulino.
– Melhor curta-metragem pelo Júri da Crítica, Mostra Foco: Caetana (PB), de Caio Bernardo.
“Pelo investimento e confiança nas bordas do acontecimento, nos lembrando das potências políticas da opacidade, e esculpindo uma ação metafórica através de sua materialização em ideias sonoras e pictóricas, fazendo com que a economia gramática do filme exprima sua ideia motriz em cada quadro.”
– Melhor longa-metragem pelo Júri Jovem, da Mostra Olhos Livres, Prêmio Carlos Reichenbach: Parque Oeste (GO), de Fabiana Assis.
“Pelo cuidado e dignidade de se filmar o sofrimento, sem suavizar o horrível de suas imagens, ou nele se estagnar, por mostrar um futuro a ser construído por corpos que, mesmo atravessados pelo risco constante do presente, seguem adiante, e por ressoar o tremor da vida que resiste, sempre, porque essa é sua única possibilidade.”
– Melhor longa-metragem da Mostra Aurora, pelo Júri da Crítica: Vermelha (GO), de Getúlio Ribeiro.
“Por manejar, através da imprevisibilidade de sua condução, uma sutil unidade de medida para si e por conceber assim um dinâmico exercício cosmodoméstico sobre a ideia de narração, edificando uma vigorosa investigação de um Brasil sem mar, conjugando humor e experimentação estrutural.”
– Prêmio Helena Ignez para destaque feminino: Cristina Amaral, montadora de Um Filme de Verão (RJ).
“Pelo trabalho de excelência, que se constrói com precisão de olhar e fluidez entre os planos, como uma voz e presença ímpar na montagem cinematográfica, que atravessa mais de 30 anos no cinema brasileiro como uma potência que se reitera e atualiza numa execução brilhante.”
– Prêmio Canal Brasil de Curtas: Negrum3 (SP), de Diego Paulino.
Ao logo desta semana, nós publicaremos críticas, entrevistas e podcasts sobre os filmes vistos em Tiradentes.
Acompanhe a cobertura completa da 22ª Mostra de Cinema de Tiradentes no cinematório.