"Parasita" (Parasite, 2019) - Foto: Pandora Filmes/Divulgação
    Foto: Pandora Filmes/Divulgação

    cinematório café #108: “Parasita” nosso de cada dia

    Renato Silveira e Kel Gomes·

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    Neste podcast, discutimos “Parasita” (Parasite, Coreia do Sul, 2019), filme dirigido por Bong Joon-ho e grande vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano. Cotado também para o Oscar 2020, o longa-metragem é uma sátira social sobre uma família que vive um período de crise financeira e não tem escrúpulos para aproveitar uma oportunidade de ter uma vida luxuosa.

    “Estamos vivendo uma época em que o capitalismo é a ordem reinante e não temos alternativa. Isso no mundo inteiro. Na sociedade capitalista de hoje, existem castas que são invisíveis aos olhos. Nós tratamos as hierarquias de classe como uma relíquia do passado, mas a realidade é que ainda existem e não podem ser ultrapassadas.” — Bong Joon-ho

    Para o bate-papo, nós recebemos Ana Lúcia Andrade, professora de Cinema da Escola de Belas Artes da UFMG.

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    O cinematório café é produzido e apresentado por Renato Silveira e Kel Gomes. A cada episódio, nós propomos um debate em torno de filmes recém-lançados e temas relacionados ao cinema, sempre em um clima de descontração e buscando refletir sobre imagens presentes no nosso dia a dia.

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    Hyperlinks deste episódio:

    — Trailer:

    — Bong Joon-ho comenta a cena de abertura de “Parasita”:

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    6 Responses

    1. Esse filme vi muita coisa que pensei que tava viajando ou levando pra longe demais mas pelos comentários no programa talvez sejam válidos. Um pouco Bacurau e até Que Horas ela Volta (se ela voltasse p da vida). O pessoal pobre tem o negócio que eles ganharam a pedra pra atrair riqueza mas na casa deles a coisa que tá acima de tudo é a privada que provavelmente toda hora, não só na enchente, cospe merda pra todo lado. O menino que quer ser índio, como apontaram, me fez lembrar do Céu e Inferno do Kurosawa que o menino tá fantasiado de cowboy; isso, de longe mesmo, pode ser um aspecto daquela coisa que Coréia e Japão não se entendem (como a mulher fala sobre as mesas como formação de batalha). Na cena que todo mundo ficou escondido embaixo da mesa parece absurda por ninguém ser visto mas isso é porque eles são invisíveis pra sociedade. Quando o outro quase fala que não suporta cheiro de pobre. Como na parte final os ricos ficam uns escrotos por causa do ressentimento por eles terem tudo e aí são chamados pra trabalhar depois de perderem tudo. É muita coisa num filme só.

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    2. Sobre o questionamento do Renato. Durante o epílogo o próprio filho diz que a polícia está os perseguindo. Se ele saísse de lá ele poderia ser preso a qualquer hora. Ele tem que se proteger e proteger sua família!

      Sobre a mudança nos ricos, ela ocorre quando a família passa a ver a família Park como eles realmente são. É como se até aquele momento víssemos a família Park com os olhos da família Kim. A partir daquele momento passamos a ver as coisas pelos olhos dos Kim. Nossa visão é a visão da família Kim somos guiados pelos olhos deles!

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    3. Olha eu aqui de novo com um comentário gigante!

      Ao fim do filme eu estava anestesiado, fiquei uns 10 minutos sentados parado olhando o nada, digerindo o que acabei de ver. É um filme com crítica social fortíssima que se encaixa em qualquer país. Vai aqui uns detalhes de minha visão:

      – No momento em que a família Kim está em casa durante a enchente tentando salvar tudo, Moon-kwang (a ex-governanta) vomita no vaso do bunker no mesmo momento o vaso da família Kim “gospe” o esgoto. É como se o que a família Park jogasse fora fosse o que a família Kim recebesse, incluindo as porcarias que vão vaso abaixo.

      – Sobre a montagem acho genial. No porão a câmera está pertinho deles em close, já na casa dos Park é sempre plano aberto, fazendo um paralelo espetacular da diferença social e de classes. E nesse paralelo acho genial a cena do ginásio lotado sendo contraposto no momento seguinte pela sala dos park enorme só com o casal deitado no sofá. Ainda nessa onda o que falar dos paralelos em que vemos a mãe se embelezando se arrumando para a festa enquanto o povo do ginásio disputam roupas velhas, e depois vemos o Sr. Park subir de pijama de seda. E lá com pouco espaço na casa dos Park tudo espaçoso.

      – Outro detalhe que acho “maravilhoso” é a Sra. Park no telefone falando em como a chuva foi maravilhosa, como ela está feliz que choveu, como aquela chuva foi uma benção, enquanto o Sr. Kim escuta, a elite está tão absorta no seu mundo do que é bom para si mesmo do que faz bem para si que nem pensam que outros estão sofrendo com aquilo que lhes causa prazer.

      – Um outro paralelo genial é enquanto os Park fazem festa outros muitos lutam para sobreviver. E para os Park tudo gira em torno deles. Todos devem fazer o que eles querem, e o mais importante é a festa do reizinho da casa e não pensam nos outros. Algo da raça humana primeiro eu e minha família. Os outros que se danem.

      – Sobre o cheiro, é interessante como as pessoas em si tem cheiros característicos. Existem cheiros que quando sinto minha avó vem a minha mente, já outros cheiros me causam angústia. Os cheiro nos lembram coisas e de pessoas. Quando o menino sente o cheiro dos Kim ele simplesmente diz que o cheiro deles é igual mas não diz se é ruim ou não. O cheiro só incomoda o pai, o motivo? Será que ele também não foi pobre um dia e cresceu na vida e talvez tenha vivido em um porão mofado e tem aversão ao seu passado? Ou será que como o Caco Antibes ele tem horror a pobre. Acho muito simbólico que quando a filha do Sr. Kim está esfaqueada, Geun-sae está ferido morrendo, Da-song desmaiado em convulsão e o Sr. Park se incomoda com o cheiro. Tanta coisa para se preocupar mas ele se incomoda com o cheiro! O que é cheiro enquanto outros estão perdendo sua vida?

      – Sobre o final que tantos falam ser anticlimático, não acho. Acho perfeito e poético. Principalmente quando Ki-woo diz que só não consegue rir quando assiste os noticiários. Afinal 3 pessoas morreram e uma está morta mas ninguém sabe. Mas só falam da tragédia da família Park, da morte do Sr. Park, porque o Sr. Park Morreu, o que motivou o Sr. Kim a matar o Sr. Park. Mas ninguém fala da morte de Ki-jung, nem o que motivou Geun-sae a matá-la, nem falam de sua morte, quem era ele, o que o motivou a atacar Ki-woo, ou onde está sua esposa. Tudo gira em torno da elite, dos ricos, e os pobres são deixados no porão escondidos. A narração em off encaro como a carta que Ki-woo escreveu para o pai e nunca poderá entregar. É triste demais esse final, o pai ficará até morrer mandando o mesmo recado ao filho, o filho continuará a subir lá em cima até provavelmente ver que a luz não pisca mais, e ele continuará lá no porão sem futuro. A última tomada do filme, que mostra o Ki-woo sentado na sala minúscula com a carta na mão que nunca poderá ser entregue me fez chorar. Principalmente quando você lembra que tudo isso aconteceu por culpa dele.

      – Quanto a fantasia dele, acho totalmente normal, ele quer salvar o pai, e nunca vai conseguir, então ele tem de sonhar, porque os sonhos são as únicas coisas que ninguém pode tirar dos pobres!

      Abraços

      Bons filmes e bom café!

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    4. A história da “calcinha ordinária” me lembrou um comentário feito pelo radialista Dan Savage, em seu podcast semanal de correio sentimental “Savage Lovecast”:

      Apesar das taras/ fetiches/ parafilias serem encontradas nas mais diversas culturas e classes sociais, um estudo de 2018 sugere que as fantasias sexuais secretas de gente com tendência libertária (que cultiva igualdade de direitos e liberdade) tenderiam a envolver situações de DESNÍVEL de poder: assédio, chantagem, estupro, sequestro, sadomasoquismo etc. Já as fantasias sexuais secretas de gente com tendência autoritária (que cultiva hierarquia social e tradição) tenderiam a envolver situações de IGUALDADE de poder e desafio às convenções sociais: parceiros de outras raças, relacionamentos homossexuais, travestismo, orgias etc.

      Tenho lá minhas dúvidas, pois – já caindo na falácia da estatística da amostragem pequena – conheço pelo menos dois mínions que curtem S&M. E tenho comigo a teoria de que o fascismo brasileiro é um caso de parafilia que extrapolou da alcova para a vida pública: se nossos fascistas não fossem covardes, procurariam os quartéis para saciar seu desejo sexual por fardas (cisvestismo) e deixariam a política em paz.

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