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“Little Fires Everywhere” ou um retrato verdadeiro de falsas famílias

"Little Fires Everywhere" (2020) - Distribuição: Amazon Prime Video

"Little Fires Everywhere" (2020) - Distribuição: Amazon Prime Video

Racismo, maternidade e relacionamentos. Esses são os tópicos principais da minissérie “Little Fires Everywhere”. Baseada na obra literária homônima de Celeste Ng, a história se passa no ano de 1997 e acompanha as famílias Richardson e Warren, residentes de Shaker Hights, um subúrbio norte-americano. O título (que significa “pequenos incêndios por toda parte”) é uma tradução literal do que a sociedade vive: não temos mais espaço para falsas aparências ou, pelo menos, não deveríamos ter. A sequência de abertura é um início do fim, mas, neste primeiro momento, não entendemos do quê.

De um lado temos a jornalista Elena Richardson (vivida por Reese Witherspoon, de “Big Little Lies”), que leva uma vida confortável, fazendo parte da classe média alta, e é obcecada por construir uma imagem perfeita em torno de si e de sua família. Do outro lado temos Mia Warren (interpretada por Kerry Washington, de “Scandals”), uma artista que vive viajando com sua filha por diversas cidades a fim de produzir fotografias sobre os lugares que visita. O fato de Mia ser negra e levar um estilo de vida nômade desperta curiosidade, mas também um certo incômodo em Elena e revela o seu preconceito mascarado.

À medida que assistimos a cada episódio, a minissérie gera incômodos com as atitudes e os comentários de Elena. Ela representa a classe média limitada em pensamentos e com a idealização de uma meritocracia que não existe. É o retrato do falso progressismo político empregado no discurso sobre pautas sociais, como: “Não sou racista, olha tenho até amigos que são afrodescendentes!” Uma imagem antipática que Witherspoon executa com maestria. Os “incêndios”, no entanto, não acontecem apenas de um lado da trama. Da parte das Warren, começa a existir desavença e afastamento entre mãe e filha. O estilo de vida promovido por Mia não foi o sonhado por Pearl (Lexi Underwood). E onde, em um primeiro momento, parecia haver uma relação de cumplicidade e equilibrio, acaba revelando um abismo de valores e interesses.

A maternidade é tratada de uma maneira muito sensível, até mesmo nos assuntos espinhosos, como aborto e adoção. O fato de a produção ter olhares femininos em toda a sua construção (direção, roteiro e produção) ajuda muito na dimensão do que sentimos e absorvemos de cada personagem. Além da maternidade, enxergamos as mães de “Little Fires Everywhere” como indivíduos com desejos, passado e sonhos. Afinal, muitas vezes esquecemos que quando mulheres “decidem” se tornar mães, elas não deixam de ter suas outras facetas.

Originalmente distribuída pela plataforma Hulu, “Little Fires Everywhere” está disponível aqui no Brasil pela Amazon Prime Video. No momento que vivemos, quando os debates racial e feminista estão em alta e o mundo pede um rompimento urgente de valores e comportamento, a minissérie contribui para essa quebra de maneira positiva. A grandiosidade da produção está na sua profundidade de reflexão. Cada episódio exige um respiro e um olhar para os nossos comportamentos e em como encaramos determinadas atitudes na sociedade. Não há mais espaço para falsas ideias de famílias. Que os incêndios provocados queimem além da tela. ■

Nota:

LITTLE FIRES EVERYWHERE (2020, EUA). Direção: Lynn Shelton, Nzingha Stewart, Michael Weaver; Roteiro: Liz Tigelaar (baseado no livro de Celeste Ng); Produção: Harris Danow, Rosa Handelman, Shannon Houston; Fotografia: Trevor Forrest, Jeffrey Waldron; Montagem: Tyler L. Cook, Amelia Allwarden, Phyllis Housen; Com: Reese Witherspoon, Kerry Washington, Lexi Underwood, Joshua Jackson, Rosemarie DeWitt; Estúdio/Produtora: ABC Signature Studios; Distribuição: Hulu, Amazon Prime Video. 8 episódios x 60 min

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