Em sua mais recente empreitada literária, o cineasta Guillermo del Toro (“O Labirinto do Fauno”, “A Forma da Água”) se junta novamente a Chuck Hogan, com quem publicou junto a aclamada Trilogia da Escuridão, que deu origem à série de TV “The Strain”. Em “As Fitas de Blackwood”, primeiro volume de “As Sombras do Mal”, um mal ancestral que vaga pela Terra desde o início dos tempos está no centro da trama, recheada com assassinatos hediondos e rituais do ocultismo.
A história nos apresenta à agente do FBI Odessa Hardwicke. Ao testemunhar um crime brutal e inexplicável, ela se vê forçada a matar o companheiro de trabalho, o que a leva a questionar sua sanidade. Na ocasião, Odessa viu um vulto sair do corpo do amigo, um fato aterrorizante que jamais se apagará de sua mente. Após a tragédia, Odessa encontra fitas antigas ao organizar os pertences de um agente aposentado. A partir daí, ela encontra Hugo Blackwood, um homem enigmático que pode ser a chave para desvendar o que aconteceu com o parceiro de Odessa e dar a ela a chance de defender a humanidade de uma ameaça sem rosto: os incorpóreos, espíritos vis que se alimentam de emoções e que se apoderam de suas vítimas.
“As Fitas de Blackwood” utiliza três linhas cronológicas distintas. Além da trajetória de Odessa, acompanhamos, em 1962, um jovem agente do FBI chamado Earl Solomon, que encontra Blackwood durante um caso semelhante ao de Odessa. A terceira trama, anterior às duas principais, é situada na Inglaterra de 1562, quando um portal é aberto e permite que os incorpóreos entrem em nosso mundo. Mais de 400 anos depois, Blackwood, que teve sua vida prolongada por meios mágicos naquele episódio, tem a chance de terminar a sua caça às entidades malignas.
À medida que a narrativa avança, as tramas de Solomon e Odessa convergem uma com a outra até finalmente se integrarem nos dias atuais. Del Toro e Hogan fazem isso muito bem, com um ritmo rápido e envolvente, sem causar confusão com a alternância de linhas do tempo. Outro ponto positivo está na descrição detalhada dos rituais macabros e dos assassinatos, proporcionando uma visualidade que só nos leva a crer que uma adaptação para o cinema ou TV já foi também pensada pela dupla — e, caso isso aconteça, será fascinante ver como o demônio Obediah será representado.
No entanto, se o nível de detalhes e o espirituoso estilo de escrita dos autores são qualidades inegáveis, por outro lado eles pecam no desenvolvimento de Blackwood e de Solomon. Ainda que seja clara a intenção de dar o protagonismo à Odessa, os dois mereciam mais atenção. Obviamente, os próximos livros poderão se aprofundar nesses dois personagens. Então, de largada, é bom que ao menos este primeiro volume desperte nosso interesse por ambos.
Quem começar a ler “As Sombras do Mal” com a sede de encontrar uma nova Trilogia da Escuridão poderá se decepcionar um pouco. Apesar de todo o sangue e dos elementos sobrenaturais, a história está mais ligada ao gênero policial do que ao horror (aliás, o próximo filme de del Toro é uma refilmagem do clássico filme noir “O Beco das Almas Perdidas”, de 1947, então, tramas policiais são mesmo o centro de seus interesses atualmente). De todo modo, o conceito aqui é tão atraente quanto ao da obra anterior e o livro prende nossa atenção do início ao fim. É um prato cheio para quem gosta do realismo fantástico dos filmes de del Toro e anseia por novos mergulhos na imaginação deste brilhante artista, que encontrou em Hogan um parceiro formidável.
AS SOMBRAS DO MAL: As fitas de Blackwood (Vol. 1), de Guillermo del Toro e Chuck Hogan
Editora: Intrínseca
Tradução: Stephanie Fernandes
Páginas: 320
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