CineOP retorna à programação presencial e destaca cinemas indígenas

Após dois anos em formato online, a CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto volta ao formato presencial em sua 17ª edição, que vai até 27 de junho. Mas o público de fora da cidade histórica também é contemplado com exibições e atividades virtuais de acesso gratuito por meio do site oficial. A mostra promove uma programação intensa de filmes, oficinas, rodas de conversa, debates, masterclasses e atrações artísticas, a partir da temática central “Preservar, transformar, persistir”. As curadorias desenvolveram trajetos de reflexão que destacam produções realizadas por cineastas indígenas e seus processos criativos, além de reforçar a importância da memória e da preservação e discutir as perspectivas de futuro para o audiovisual no Brasil.

A CineOP se consolidou no circuito brasileiro de mostras e festivais como o mais importante evento que aborda o cinema com foco em patrimônio. As temáticas da programação abrangem três eixos: preservação, história e educação. Ao todo, são 151 filmes vindos de oito países e de 21 estados brasileiros, distribuídos nas mostras Contemporânea, Homenagem, Preservação, Histórica, Educação, Mostrinha e Cine-Escola.

Abertura oficial e homenagem

O evento de abertura acontece na noite de 23 de junho, quinta-feira, às 19h30, na Praça Tiradentes, em Ouro Preto com performance audiovisual de apresentação das três temáticas da CineOP e de homenagem aos cineastas M’bya Guarani: Kuaray (Ariel Ortega) e Pará Yxapy (Patrícia Ferreira). O tributo deste ano surgiu a partir da forma como as questões culturais e políticas aparecem nos filmes de ambos, de naturezas distintas e pontuadas pela aproximação da urbanidade em relação às terras de seus povos.



A dupla de realizadores é uma referência na produção dos povos indígenas, cada vez mais intensa e inserida em festivais e mostras de cinema. Para ilustrar suas obras, serão exibidos o média-metragem “Bicicletas de Nhanderú” (2011) e o curta-metragem “Nossos Espíritos Seguem Chegando – Nhe’e Kuery Jogueru Teri” (2021). A dupla estará no debate “Dois cineastas e um percurso”, no dia 24, sexta-feira, às 12h, no Centro de Convenções de Ouro Preto, com as presenças ainda de Bruno Huyer (antropólogo), Ernesto de Carvalho (cineasta) e Sophia Pinheiro (cineasta).

M’byas Guaranis Kuaray (Ariel Ortega) e Pará Yxapy (Patrícia Ferreira) – Foto: Universo Produção

CineOP é história

O recorte da Mostra Histórica se deu a partir da proposição “Cinemas Indígenas: Memórias em Transmissão”. Nos últimos 20 anos, vivencia-se uma transição progressiva para a autocriação de filmes de povos indígenas, sem interferências de não-indígenas na construção da estética e da linguagem, o que traz a percepção cada vez mais ampla das singularidades formais dessa produção. O curador Cleber Eduardo explica que “nessa programação há dois grandes grupos de filmes: os que giram em torno da terra, do território, das demarcações, das invasões, nos quais a presença branca é sempre o inimigo, sejam atritos do passado ou do presente; e os que trabalham a resistência de certas tradições, rituais e reelaborações identitárias a partir de suas espiritualidades”.

As sessões incluem filmes como “Já me Transformei em Imagem” (Zezinho Yube, 2008), “Zawxiperkwer Ka’a – Guardiões da Floresta” ( Jocy Guajajara e Milson Guajajara, 2019), “Nguné Elu: O Dia em que a Lua Menstruou” (Takumã Kuikuro, Maricá Kuikuro, 2004) e “Watoriki Xapiripë Yanopë: Casa dos Espíritos” (Morzaniel Iramari, Dário Kopenawa, 2010).

“Watoriki Xapiripë Yanopë: Casa dos Espíritos” (2010), de Morzaniel Iramari e Dário Kopenawa – Foto: Divulgação

CineOp é preservação

Na Mostra Preservação, o tema é “Memória audiovisual no Brasil: resistência e resiliência no tempo”, a partir de aflições muito concretas e potencializadas no histórico problema da falta de políticas públicas de preservação audiovisual. A situação entrou em estado ainda mais grave com o impacto da pandemia de COVID-19 nos últimos dois anos e a derrocada da Cinemateca Brasileira desde 2016, somente agora em lenta reestruturação. Segundo as curadoras Daniela Giovana Siqueira e Fernanda Coelho, os filmes que compõem a Mostra Preservação reverberam “o audiovisual e sua relação com a memória, vinculada a histórias de resistência e resiliência”.

Um dos destaques é o estudo de caso do documentário “História da Guerra Civil”, filme de 1921 de Dziga Viértov recentemente restaurado por Nikolai Izvolov. Em sessão comentada, Izvolov contará detalhes do processo de restauração da obra e será acompanhado por Luis Labaki, cineasta e pesquisador especialista na obra de Viértov. Também as efemérides do bicentenário da declaração de Independência e do centenário de Semana de Arte Moderna serão abordadas pela Mostra Preservação, especialmente dentro do Encontro Nacional de Arquivos e Acervos Audiovisuais.

E ainda, em sessão online, o documentário “São Paulo em Hi-Fi”, de Lufe Steffen, apresenta material de arquivo e entrevistas que resgatam a memória da cena gay paulistana, que resistiu aos preconceitos sociais em plena ditadura militar e, anos depois, ao momento de explosão do vírus HIV.

“São Paulo em Hi-Fi” (2013), de Lufe Steffen – Foto: Divulgação

CineOP é educação

Na Mostra Educação, cujo eixo é “Cinemas e educações: diálogos”, houve o movimento de aproximar o cinema ameríndio dos processos educacionais num momento de “audiovisualização da vida” por conta da pandemia, como afirma Adriana Fresquet, curadora, junto com Clarisse Alvarenga. Um dos destaques é a série “La Combi del Arte: Dicionários Audiovisuais Comunitários”, desenvolvido pela convidada peruana Teresa Castillo com o objetivo de revitalização das línguas indígenas. “Ela viaja produzindo, com as comunidades nativas, uma série de ações para fortalecer e revitalizar as respectivas línguas a partir do aprendizado e técnicas audiovisuais”, conta Fresquet. Parte desse trabalho de Castillo será apresentado nas sessões dos “Dicionários” na CineOP, assim como na masterclass da própria realizadora.

A presença do documentarista e professor boliviano Miguel Hilari inclui na CineOP alguns de seus trabalhos mais essenciais: “O Curral e o Vento” (2014), que se conecta à origem aymara do cineasta por meio de imagens e sons que evocam o tempo e espaço andinos; e “Companhia” (2019) e “Bocamina” (2020), de clara inspiração nas suas origens e na defesa da educação do campo.

“Bocamina” (2020), de Miguel Hilari – Foto: Divulgação

Mostra Contemporânea

Na mostra de filmes contemporâneos, serão exibidos 10 longas-metragens, seis deles presencialmente em Ouro Preto e quatro disponibilizados online. Com curadoria de Cléber Eduardo, a seleção reflete passado e memória e inclui obras como “Adeus Capitão” (Vincent Carelli), “A Mãe de Todas as Lutas” (Suzana Lyra), “Quem Tem Medo?” (Dellani Lima, Henrique Zanoni e Lucas Barbi), “O Bom Cinema” (Roberto Pupo), “Glauber, Claro” (Cesar Meneghetti), entre outros.

Já na programação de curtas e médias-metragens, com curadoria de Camila Vieira, destacam-se “Santo Rio” (Lucas de P. Oliveira e Guilherme Nascimento), que resgata São Sebastião do Soberbo, comunidade destruída para a construção da Usina Hidrelétrica Candonga, em Minas Gerais; “Central de Memórias” (Rayssa Coelho e Filipe Gama), sobre quatro mulheres de um bairro de Vitória da Conquista (BA) e o encontro com o universo do cinema nos anos 1990; “Sei que é Tudo Memória” (Nathália Oliveira), no qual a diretora faz um processo de luto e afirmação da vida a partir da morte dos pais; “O Lugar que Somos” (San Marcelo), em que a personagem se vê num dilema, após ser demitida, entre o sonho de ser dançarina profissional ou ficar perto da família e enfrentar os problemas diários agravados pela condição física da mãe.

Para a programação on-line, há duas sessões de curtas com recortes específicos: “Preservar a História e seus Registros” é composta por cinco filmes, enquanto “Usar e Remontar Arquivos” apresenta quatro títulos. Destaque para “A Viagem Sem Fim, codireção de Priscyla Bettim e Renato Coelho, que são tomados pelo gesto de remontar “O Descobrimento do Brasil (1937)”, de Humberto Mauro; “Quem de Direito”, de Ana Galizia; e “A Ordem Reina”, de Fernanda Pessoa.

E, novamente em parceria com a TV UFOP, a CineOP conta ainda com duas sessões de curtas brasileiros realizados em universidades, escolas de cinema ou núcleos de formação em audiovisual. Neste grupo, destaque para “Não Vim No Mundo Para Ser Pedra”, de Fabio Rodrigues Filho (UFMG), e a ficção “Através dos Sentidos” (2021), de Gilson Nascimento (Universidade Estácio de Sá – RJ), com o ator Milton Gonçalves, falecido recentemente, em 30 de maio.

“Não Vim No Mundo Para Ser Pedra” (2021), de Fabio Rodrigues Filho – Foto: Divulgação

Durante os seis dias de evento, a 17ª CineOP garante ao público a oportunidade de vivenciar conteúdos inéditos, descobrir novas tendências, assistir aos filmes, curtir atrações artísticas (incluindo show de Marina Sena, cantora e compositora mineira que se tornou destaque do pop nacional), trocar experiências com importantes nomes da cena cultural, do audiovisual, da preservação e da educação, participar do programa de formação e de debates temáticos, tudo de forma gratuita. Além da extensa programação presencial, as exibições, masterclasses e debates online possibilitam a participação remota de qualquer lugar do mundo.

SERVIÇO
17ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto
De 22 a 27 de junho de 2022
Presencial em Ouro Preto, Minas Gerais
Online em plataforma oficial (acesse aqui).

 

Com informações da assessoria de imprensa da 17ª CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto