Despertar o encanto não é uma tarefa fácil. De acordo com o dicionário Oxford Languages, “encanto” é quem ou o que agrada, atrai, deslumbra por suas qualidades. Ou seja, aquilo que se propõe a encantar o outro precisa oferecer beleza, simpatia, afeto, criatividade… A lista é extensa e, apesar da dificuldade, geralmente, quem a segue conquista a admiração e a fidelidade do público.
Neste caminho há 100 anos, a Disney vem encantando sua audiência, principalmente através de suas animações. Diversas obras do estúdio têm em suas histórias características que cativam crianças e adultos há várias gerações. E “Wish: o Poder dos Desejos” chega aos cinemas tentando trazer todos esses ingredientes juntos.
O filme, que é a 62ª animação da Disney, foi o escolhido para comemorar os 100 anos do estúdio, trazendo um tema extremamente importante para a empresa: desejos. Durante um século, o ponto principal das narrativas dos filmes da Disney foi os sonhos — quem não se lembra da vontade de Ariel em se tornar humana, ou da grande aspiração da Mulan em ser uma guerreira? A trama de “Wish” apresenta o tema de uma maneira doce, ingênua, encantadora e leve, mas ao mesmo tempo com muita paixão e intensidade, o que impede que a história fique apenas no campo da fantasia, permitindo ao público se conectar com o que vê na tela.
“Wish” apresenta Asha, uma jovem idealista e perspicaz, que deseja acompanhar de perto o trabalho de um feiticeiro e guardião de sua cidade natal. Este personagem cósmico é o responsável por fazer os desejos dos moradores do Reino de Rosas virarem realidade. Asha quer se tornar a aprendiz dele para entender como funciona esse processo e fazer parte do mundo mágico. Porém, a garota encontra um obstáculo em sua jornada e passa a ter que enfrentar um inimigo muito perigoso e cruel.
No primeiro momento, o roteiro escrito por Jennifer Lee (também roteirista de “Frozen”) e Allison Moore parece comum. E é mesmo, mas, levado em conta o seu contexto, ele se torna maior. É importante saber que esta animação foi criada para homenagear a Disney, ou seja, não há nada de inovador ou surpreendente nos personagens ou no enredo.
Os diretores Chris Buck (também de “Frozen”) e Fawn Veerasunthorn tiveram a missão de trazer à obra características clássicas que fizeram sucesso nas animações do estúdio durante um século. Uma receita que envolve uma princesa carismática, um vilão aterrorizante, um animal ou um objeto que se torna a dupla da protagonista, muitas cores e, claro, várias músicas e danças coletivas. Esta era a função dos cineastas, que conseguiram cumpri-la em partes.
Segundo a própria Disney, os animadores do filme se inspiraram na Rainha Má (de “Branca de Neve”) e na Malévola (de “Bela Adormecida”) para fazer a animação do Rei Magnífico (voz de Chris Pine), que realmente ficou muito bom esteticamente. O personagem carrega consigo uma paz e empatia no primeiro momento, mas, ao se revelar como vilão, muda da água para o vinho, demonstrando ser um homem egocêntrico e cruel. O desenvolvimento do Rei ao longo da história é interessante, porém, a conclusão da sua narrativa é simplista e rápida, o que pode não causar impacto no público.
Em contrapartida, tudo o que está relacionado a Asha (voz de Ariana DeBose) é encantador, algo típico das princesas da Disney. Suas músicas, seu visual, os integrantes da família, as motivações e seus sonhos, tudo é mágico e relacionado ao tema central do filme. Além disso, a protagonista traz ainda a bandeira da representatividade para a obra: trata-se da segunda princesa negra da Disney, e a primeira a usar tranças no estilo box braids. Os mascotes de Asha também são adoráveis, sendo capazes de provocar os risos e suspiros de quem assiste ao filme e torce por uma vitória da personagem.
A escolha do 3D que simula a animação tradicional 2D também é um acerto de “Wish”. Qualquer pessoa que conheça o mínimo dos filmes da Disney consegue identificar o estilo e a estética do estúdio neste novo longa, o que se revela mais uma bela homenagem aos 100 anos da Disney. O longa tem ainda uma fotografia agradável, mesmo com o uso de diversas cores distintas e vários elementos em cena, o que contribui para um visual mágico e convidativo.
E por falar em características marcantes das animações da Disney, nós pensamos imediatamente nas canções, não é mesmo? Pois bem, “Wish” é um musical assumido, com cenas longas de muita cantoria e dança. Porém, a trilha sonora não apresenta nenhuma melodia ou letra que ficam grudadas na cabeça. Isso não significa que as músicas são ruins: elas são apenas esquecíveis.
“Wish: o Poder dos Desejos” cumpre em parte o que promete. A homenagem aos 100 anos da Disney é apresentada de uma forma linda e nostálgica, com várias referências para os fãs inclusive. Um exemplo? A própria estrela que acompanha Asha em sua jornada tem um significado na letra da música-tema do estúdio: na clássica “When You Wish Upon A Star”, um trecho diz que basta pedir algo a uma estrela no céu e este pedido será realizado. Além disso, as expressões faciais e interações da personagem foram baseadas em cenas e momentos importantes de Mickey Mouse.
Títulos como “Branca de Neve” e “Cinderela” também são lembrados em “Wish”, ativando novamente a nostalgia da plateia. Com tudo isso, é claro que um fã dos clássicos da Disney se sentirá muito representado. Por outro lado, quem espera assistir a uma obra memorável pode se decepcionar.
Talvez, a quantidade de ingredientes usados para a homenagem sobressaiu ao inédito, ao original, e por isso a história se tornou algo simples. Mas não dá para negar que a simplicidade da Disney é diferenciada e muito bem executada. É um simples que diverte, que envolve e, principalmente, que encanta e inspira. Não há como sair do cinema sem a sensação de esperança de que os nossos sonhos podem se tornar realidade. ■
filme wish o poder dos desejos
filme wish o poder dos desejos
WISH: O PODER DOS DESEJOS (Wish, 2023, EUA). Direção: Chris Buck, Fawn Veerasunthorn; Roteiro: Jennifer Lee, Allison Moore; Produção: Peter Del Vecho, Juan Pablo Reyes Lancaster-Jones; Fotografia: Rob Dressel, Adolph Lusinsky; Montagem: Jeff Draheim; Música: Dave Metzger, Julia Michaels, Benjamin Rice; Com: Ariana DeBose, Chris Pine, Alan Tudyk, Angelique Cabral, Victor Garber, Natasha Rothwell, Jennifer Kumiyama, Harvey Guillén, Evan Peters, Ramy Youssef, Jon Rudnitsky; Estúdio: Walt Disney Animation Studios; Distribuição: Walt Disney Studios; Duração: 1h 35min.
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Jornalista e crítica de cinema, sempre que pode está falando de filmes de heróis, animações, comédias românticas ou blockbusters. O jornalismo esportivo foi sua grande paixão durante a graduação. Há pouco, descobriu que o que gosta mesmo é de falar sobre produções audiovisuais, sejam elas filmes que concorrem ao Oscar ou um bom título do Darren Star. Atualmente também trabalha como produtora de TV na Rede Minas.