Pensado em um cenário distópico, “O Clube das Mulheres de Negócios” entristece por ser mais real do que parece. Na realidade imaginada pela cineasta Anna Muylaert (diretora de obras premiadas como “Durval Discos”, “É Proibido Fumar” e “Que Horas Ela Volta”), nós somos apresentados a um cenário em que as mulheres se tornam opressoras e os homens são oprimidos. Com isso, todos os estereótipos sociais se tornam inversos ao que somos expostos diariamente fora da tela.
Flertando com o horror e a comédia, as analogias do filme são bem claras, indo desde o político violento que defende falsos valores até a falsos líderes religiosos interessados em construir fortuna e se inserir politicamente. O matriarcado criado para o longa não altera a realidade: só inverte os papéis que vivenciamos dentro do machismo estrutural.
Na trama, nós acompanhamos o jovem repórter e herdeiro Candinho (Rafael Vitti) e o renomado fotógrafo Jongo (Luis Miranda), que têm como missão entrevistar e registrar o encontro das associadas do famoso Clube das Mulheres de Negócios do título — uma associação que opera há séculos reunindo as mais ricas e poderosas personalidades do país. Em meio a isso, descobrimos que a presidente do clube, Cesárea (Cristiane Pereira), possui uma coleção de onças e que três delas estão soltas na propriedade, o que instaura ainda mais o caos e o terror.
Apesar de a história tentar abordar e trazer luz para os mais diversos absurdos que vivemos em nossa recente história (como fazer alusão a um ex-presidente adepto do uso de armas e defensor da ditadura militar), o longa peca pelo excesso de estereótipos e por querer tratar de muitos problemas sociais ao mesmo tempo, perdendo o foco narrativo na maioria das vezes.
Por mais que Muylaert seja feliz em construir alusões e metáforas, a diretora e roteirista acaba nos tirando da narrativa pelo excesso de informações colocadas na tela. Em algumas cenas, nós acompanhamos a busca do fotógrafo pelo funcionário que supostamente foi atacado por uma onça e vamos, ao mesmo tempo, descobrindo a podridão por trás de cada uma daquelas mulheres.
Mesmo que tais descobertas não façam tanto sentido na forma como são apresentadas, existe um objetivo interessante ali, apesar da falha na execução. As provocações em relação a temas como a corrupção e o abuso sexual perdem força pela velocidade de mudança de assuntos. Este problema não esvazia a pauta, porém, faz com que ela perca força, o que é ainda mais frustrante diante das boas atuações de Irene Ravache e Grace Gianoukas, que se destacam em meio ao grande elenco.
As onças perdidas são colocadas em perfeito paralelo às notas de 50 reais, fazendo uma brincadeira inteligente em relação ao perder os limites a troco de “grana”. No final, também existe um quê de ninguém vence o dinheiro ou a natureza, e a exploração excessiva acaba por nos colocar na pior crise climática que a humanidade já vivenciou.
“O Clube das Mulheres de Negócios” se revela uma forma cômica de responder ao sistema patriarcal. Mesmo com falhas no roteiro, o filme brinca e nos desafia a pensar nos desconfortos e violências que nós mulheres passamos diariamente. ■
O CLUBE DAS MULHERES DE NEGÓCIOS (2024, Brasil). Direção: Anna Muylaert; Roteiro: Anna Muylaert; Produção: Mayra Lucas, Anna Muylaert; Fotografia: Bárbara Alvarez; Montagem: Karen Harley, Marina Kosa; Música: André Abujamra, Mateus Alves; Com: Rafael Vitti, Luis Miranda, Cristina Pereira, Irene Ravache, Louise Cardoso, Katiuscia Canoro, Grace Gianoukas, Polly Marinho, Helena Albergaria, Shirley Cruz, Ítala Nandi, Maria Bopp, Verônica Debom, André Abujamra, Fernando Billi, Tales Ordakji, Nani de Oliveira Clodd Dias; Estúdio: Glaz Entretenimento; Distribuição: Vitrine Filme; Duração: 1h 35min.