"Capitão América: Admirável Mundo Novo" (Captain America: Brave New World, 2025), de Julius Onah - Marvel Studios/Divulgação
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“Capitão América: Admirável Mundo Novo” é um bom recomeço para a Marvel

Em “Vingadores:Ultimato” (2019), sentado em um banco, embaixo de uma árvore, Steve Rogers (Chris Evans) entrega a Sam Wilson (Anthony Mackie) o escudo mais importante do Universo Cinematográfico Marvel, acreditando que o amigo era a melhor escolha para substituí-lo como Capitão América. E Rogers estava certo.

A primeira aparição de Wilson com este título foi em “Falcão e o Soldado Invernal” (2021). A série tem diversos problemas, mas o novo “Cap” não foi, nem de longe, um deles. Ele se mostrou um herói completo e eficiente, com propósitos e ideais importantes, e claro, muita força. Mas, além disso, ele apresentou dúvidas e inseguranças. Apesar de toda sua trajetória antes de assumir o escudo vermelho, azul e branco, essa incerteza ainda o acompanha, e é justamente ela que faz Sam ser a escolha perfeita.

“Capitão América: Admirável Mundo Novo” explora os desafios e responsabilidades de Wilson em seu novo papel, enquanto enfrenta novas ameaças e aliados inesperados, além de lidar com a pressão de substituir Steve Rogers. O filme tem a importante missão de introduzir Sam como o herói mais relevante do mundo para aqueles que não acompanharam a série de 2021. Por isso, seu início é claramente voltado para demonstrar que o ex-Falcão está mais do que preparado para assumir o novo posto. Além de trazer cenas de ação impactantes, o roteiro opta por dar voz ao maior admirador do novo herói, que reforça as qualidades e a força de Wilson nesse novo papel. Essa escolha, logo no começo da trama, é fundamental para evidenciar a admiração de Joaquin Torres (Danny Ramirez), o novo Falcão, pelo protagonista.



O filme leva uns 15 minutos apenas para apresentar pontos importantes para quem não assistiu à produção do Disney+, e claro, não consegue fazer isso de forma tão profunda. Afinal, a produção tem seis episódios de quase uma hora cada. No geral, o que o longa apresenta é satisfatório, porém, a forte e significativa relação de amizade entre Sam e Isaiah Bradley (Carl Lumbly) é mostrada de maneira rasa. Só quem conheceu a grandeza dessa parceria, que vai além de questões de super-heróis, consegue se emocionar nas cenas de diálogos entre os dois, por exemplo.

Mas como o filme tem a função apenas de desenhar um pouco sobre os “novos personagens”, a missão foi cumprida, e o roteiro escrito por Malcolm Spellman, Dalan Musson e Matthew Orton acerta em colocar esta amizade como motivação para Sam Wilson quebrar as regras e se rebelar contra os planos do novo presidente dos Estados Unidos: ninguém menos que Thadeus “Thunderbolt” Ross, agora interpretado por Harrison Ford.

Aliás, o enredo do filme não tem nenhum problema, e segue a linha de um título de ação comum: lutas bem coreografadas, diálogos mais objetivos, o protagonista sendo bem desenvolvido durante a trama com a ajuda dos personagens secundários, explosões e sem muitas reviravoltas. Não há nada subjetivo, está tudo ali na tela, para que seja bem fácil de entender para onde a narrativa está indo. E isso não é algo negativo, afinal, um bom feijão com arroz também merece aplausos.

"Capitão América: Admirável Mundo Novo" (Captain America: Brave New World, 2025), de Julius Onah - Marvel Studios/Divulgação
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Há bons personagens no enredo, como o próprio presidente Ross. Harrison Ford traz uma profundidade ao antagonista da história, e logo na primeira cena do filme é possível entender a carga dramática que ele traz consigo e sustenta durante toda a produção, com cenas de atuação repleta de entrega e verdade.

Com o grande tempo de tela que Ford possui, uma trama sólida foi construída para ele, ao contrário do que acontece com Samuel Sterns, novamente vivido por Tim Blake Nelson, que interpretou o papel em “O Incrível Hulk” (2008). Todas as maldades do vilão de “Capitão América: Admirável Mundo Novo” são contadas por outros personagens, e não mostradas em tela, o que diminui o efeito de suas ações. Inicialmente, Sterns só aparece de maneira sombria ao telefone, quando está conversando com seus alvos. Ao finalmente dar as caras, não há um impacto digno de um vilão, a não ser por sua aparência deformada.

Ainda sobre vilões, o Hulk Vermelho tem pouco tempo em tela, mas sua aparição é satisfatória. O roteiro acerta em cheio ao segurar sua relevação apenas para o final, permitindo que outras histórias se desenvolvam e impedindo que o foco do filme fique apenas no monstro. Visualmente falando, o CGI do Hulk Vermelho não tem nenhum problema. Em alguns momentos, ao interagir com o Capitão América, dá para notar um cenário com efeitos visuais, mas nada que cause incômodo.

"Capitão América: Admirável Mundo Novo" (Captain America: Brave New World, 2025), de Julius Onah - Marvel Studios/Divulgação
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Voltando a falar de bons personagens, o alívio cômico do filme é responsabilidade de Joaquin Torres. O novo Falcão não é um poço de carisma ou tem uma atuação memorável, mas cumpre bem o papel de “dupla amiga” do protagonista (lugar que foi ocupado em muitos filmes do MCU pelo próprio Sam Wilson). O personagem tem um alto potencial de desenvolvimento em futuras produções. Neste longa, Joaquin é quase um espelho para o Capitão América ver como é merecedor de estar carregando o escudo.

Isto acontece também com Buck (Sebastian Stan), que aparece rapidamente para dar um discurso motivacional ao herói, dizendo o quanto ele é forte e eficaz, mesmo sem contar com o soro de supersoldado. É indiscutível a química que Sam e Buck possuem e como eles são engraçados juntos. Mas a participação de Stan soa forçada e desnecessária. E mais: parece que ao colocar personagens para reafirmar a eficiência do novo Capitão América o tempo inteiro, o roteiro deseja convencer o próprio público de que ele foi a escolha certa.

Este é um problema da narrativa: afinal de contas, em dez minutos de trama, já vemos o quanto Sam é poderoso, habilidoso, inteligente, decidido e carismático, ou seja, não há necessidade de reafirmar isso o tempo todo, como quem precisa de aprovação. Mas sabemos o motivo disso acontecer. Ter um Capitão América preto nas telas não é algo simples de explicar, ainda mais em uma superprodução hollywoodiana. Inclusive o último diálogo do protagonista com Joaquin no filme é exatamente sobre Sam saber que tem que provar incansavelmente o quanto é digno, e mesmo assim, nunca ser o suficiente. É notável que ele está falando sobre uma pauta racial, que vai andar ao lado dele durante toda a trajetória com o escudo, e que pode ser ampliada também para o mundo real com a atuação de Anthony Mackie.

"Capitão América: Admirável Mundo Novo" (Captain America: Brave New World, 2025), de Julius Onah - Marvel Studios/Divulgação
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“Capitão América: Admirável Mundo Novo” é um bom primeiro filme para esta nova fase da franquia. O enredo apresentado é encerrado, mas, como na maioria das produções da Marvel, pontas são deixadas soltas, com perguntas que podem ser utilizadas para construir boas narrativas no futuro. O que vai ser da Ilha Celestial e quem vai tomar o poder dela? Quando o adamantium será apresentado novamente? A Iniciativa Vingadores será realmente reconstituída por Sam Wilson? Seth Voelker (interpretado por Giancarlo Esposito) será mais desenvolvido em outro filme?

Estas questões não são sanadas, mas o que não fica dúvida é a importância e, principalmente, a excelência de Anthony Mackie na pele do Capitão América. É inspirador vê-lo assumir o papel e tudo o que ele representa, consolidando-se como um dos principais herois do MCU. Em “Falcão e o Soldado Invernal”, Sam disse, em uma das cenas mais marcantes da série: “Sou um homem negro usando as estrelas e as listras. O que eu não entendo? Toda vez que pego esse escudo, sei que milhões de pessoas vão me odiar por isso. Eu sinto os olhares, os julgamentos e não há nada que eu possa fazer para mudar. Ainda assim, estou aqui. Sem super soro, sem cabelo loiro nem olhos azuis.” E agora, no cinema, esta é a realidade: goste ou não, o mundo terá que aceitar este homem como Capitão América. ■

Nota:

CAPITÃO AMÉRICA: ADMIRÁVEL MUNDO NOVO (Captain America: Brave New World, 2025, EUA). Direção: Julius Onah; Roteiro: Rob Edwards, Malcolm Spellman, Dalan Musson, Julius Onah, Peter Glanz; Produção: Kevin Feige, Nate Moore; Fotografia: Kramer Morgenthau; Montagem: Matthew Schmidt, Madeleine Gavin; Música: Laura Karpman; Com: Anthony Mackie, Harrison Ford, Danny Ramirez, Shira Haas, Carl Lumbly, Xosha Roquemore, Giancarlo Esposito, Tim Blake Nelson, Liv Tyler; Estúdio: Marvel Studios; Distribuição: Disney; Duração: 1h 58min.

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